Backstage

A música e o futuro dos Lotus Fever

Oito meses após o lançamento do álbum de estreia Search for Meaning, os Lotus Fever preparam-se para subir ao palco do Belém Art Fest (15 e 16 de maio). Aproveitámos o bom tempo para tomar o pulso à banda e conhecer um pouco melhor a música que corre nas suas veias.

Música em Dx (MDX) – Como é um ensaio típico dos Lotus Fever?
Lotus Fever – Bem, começamos por desmontar o material nas nossas casas e jogar um pouco de tetris (risos). Como temos carros pequenos é preciso alguma habilidade para fazer com que tudo caiba lá dentro. Depois vamos até casa do Diogo (Diogo Teixeira – baterista), que é onde ensaiamos, montamos tudo e começamos por fazer uma jam. Em seguida, ou exploramos algumas das ideias que temos ou, caso tenhamos um concerto agendado para breve, focamo-nos no alinhamento que vamos tocar.

MDX – Qual é a vossa ambição enquanto banda?
Lotus Fever – Viver disto (música), acima de tudo. Não precisamos de ter um público gigante mas sim um público que acima de tudo goste mesmo da nossa música e com o qual possamos contar.

MDX – E qual é a vossa opinião sobre o meio musical português, em termos de oportunidades para as bandas crescerem e fazerem da música um modo de vida?
Lotus Fever – Não é bom. Mas isso tem a ver com a fisionomia de Portugal: somos um país mínimo; não é como nos Estados Unidos, em que dá para estar um ano a fazer uma tour de bares. Portanto é difícil crescer. Mas somos otimistas o suficiente para achar que se persistirmos, se nos rodearmos das pessoas certas, se investigarmos e tivermos os nossos objetivos bem assentes, é possível fazer uma vida na música.

MDX – A vossa situação em Portugal começa a ser boa. E quanto ao estrangeiro, já têm algum feedback?
Lotus Fever – Não, porque não nos focámos muito nisso. Não é uma prioridade, agora.

MDX – O facto de cantarem em inglês tem alguma coisa a ver com uma ambição de ter sucesso no estrangeiro ou apenas com as vossas influências?
Lotus Fever – Tem a ver com fases. Na altura em que começámos não tínhamos assim tantas referências em português, por isso tornou-se um projeto em inglês e faz sentido que assim continue. Não foi com o objetivo de ser (um projeto) internacional; tem mais a ver com o que sempre ouvimos e com o que era mais natural fazermos. Claro que nunca diremos que não a internacionalizar o projeto, mas não foi esse o motivo.

MDX – Nunca sentiram falta de um baixista?
Lotus Fever – Já sentimos. Foi uma das primeiras batalhas que tivemos na banda. A primeira foi arranjar um baterista… e ainda estamos à procura (risos). Quando começámos à procura de baterista também queríamos um baixista. Há muito menos baixistas que guitarristas, bateristas ou vocalistas, e ainda menos baixistas de qualidade. O que aconteceu foi que o Diogo (baterista) surgiu e ficou na banda, e a questão do baixista foi-se prolongando. Entretanto começámos a tocar, e ao compor, naturalmente começámos a usar o baixo dos teclados. Não era um baixo muito pensado porque não era suposto “ficar ali”, mas com o tempo começámos a ver que se calhar poderia resultar fazer o baixo com as teclas. Eu (Bernardo Afonso – teclista) também insisti imenso nessa área porque um dos teclistas de que gosto bastante é o Ray Manzarek, dos The Doors, e eles em grande parte da carreira não tiveram baixista.

MDX – Por falar em Ray Manzarek, digam-me um músico que vos tenha influenciado na forma de tocarem o vosso instrumento.
Manuel Siqueira (guitarrista) – David Gilmour
Pedro Zuzarte (guitarrista/vocalista) – Jeff Buckley
Diogo Abreu (baterista) – John Bonham
Bernardo Afonso (teclista) – James Blake

MDX – Já são bem conhecidas algumas das vossas influências – Tame Impala, The Beatles, Bon Iver. Gostaria que me dissessem algumas razões específicas que vos levam a gostar dessas bandas ou músicos.
Lotus Fever – De vez em quando surge uma banda que quem gosta e estuda a música percebe que tem um brilho diferente: The Beatles, Pink Floyd, Queen e por aí fora. Neste momento são os Tame Impala. Nos Tame Impala ninguém está a fazer um trabalho particularmente complexo e é isso que faz com que a banda ao vivo soe inacreditavelmente bem. Especificamente, as linhas de baixo, à Paul Mccartney, são incríveis. É tudo incrível… Especificamente, é tudo incrível (risos).

Quanto aos Beatles, é fácil de resumir… eles simplesmente “inventaram” tudo. Não há nenhuma banda que em sete anos tenha lançado trabalhos de tanta amplitude em termos de estilos musicais, quando ainda ninguém tinha feito quase nada. Hoje em dia ouvimos Beatles e encontramos algumas coisas que já não são atuais, outras que são e outras que ainda não percebemos assim tão bem. É difícil encontrar uma banda rock que não tenha um bocadinho de Beatles, pelo menos indiretamente. Todos os caminhos vão dar a Beatles (risos).

Quanto a songwriters recentes, o Bon Iver é o “boss”. Faz coisas de que ninguém está à espera. Tanto grava um álbum de guitarra numa cabana como no álbum seguinte vai buscar dez músicos e grava uma sinfonia dos tempos modernos. É um génio. É muito raro encontrar alguém a cantar com aquele sentimento e fazer músicas que se ligam tão bem a quem as está a ouvir. Eu (Manuel Siqueira) sinto que consigo ouvir o álbum Bon Iver em qualquer circunstância, esteja triste, esteja contente, esteja na praia…

MDX – Acho que já estás a responder a uma pergunta que eu estou a guardar para o fim! Como é que foi trabalhar com o Ramón Galarza?
Lotus Fever – O Ramón foi muito importante para nós fazermos a transição entre não saber o que é estar em estúdio e saber o que é estar em estúdio. Com ele percebemos que o que compomos em casa não vai soar exatamente assim, há todo um jogo para chegarmos ao som que queremos. Foi também importante já termos trabalhado com ele no EP (Leave the Lights Out, 2012), o que tornou muito mais natural o processo de começar a gravar imediatamente, em vez de estarmos a aprender como se faz.

MDX – Que evolução sentiram desde que começaram até ao último álbum?
Lotus Fever – Ainda estamos a sentir e havemos de estar sempre. Mas foi fundamental conhecermos mais material, conhecermos melhor os nossos instrumentos, investir em equipamento. No início ligávamos menos a bandas recentes e hoje em dia estamos sempre à procura de bandas novas e coisas diferentes. Começámos a ouvir mais música eletrónica, tentámos fugir a ouvir só influências mais antigas e também procurámos um tipo de produção mais recente.

MDX – Neste momento estão a trabalhar em quê? Um novo álbum? Novas músicas?
Lotus Fever – Estamos a começar esse processo. Não foi fácil começar a tocar as nossas músicas ao vivo. Somos uma banda de 120 pistas por sessão por isso há muita coisa que tivemos de selecionar, perceber o que é que funciona bem ao vivo e como é que se pode executar. Investimos bastante tempo em diversificar a forma como apresentamos as músicas ao vivo, criando novos arranjos. Mas já estamos confortáveis nesse aspeto, por isso sim, estamos numa altura de começar a fazer coisas novas.

MDX – Se fossem para uma ilha deserta e só pudessem levar um álbum, que álbum seria?
Manuel Siqueira – Grace, de Jeff Buckley
Pedro Zuzarte – Grace, de Jeff Buckley
Diogo Abreu – IV, de Led Zeppelin
Bernardo Afonso – Dark Side of the Moon, de Pink Floyd…
Pedro Zuzarte – Com ou sem Feiticeiro de Oz? (risos)

MDX – Há algo a que gostariam ainda de responder?
Manuel Siqueira – Há uma pergunta a que eu gosto sempre de responder, que é: “Com que banda é que gostarias de tocar?” Eu gostava de tocar com os Sensible Soccers, seria muito porreiro. Não sei se vocês (outros membros) querem acrescentar algo…
Pedro Zuzarte: Se calhar mandamos-te um email com isso… (risos).

[Álbum completo “Search For Meaning”]

Links da banda:
Facebook – https://www.facebook.com/LotusFever?fref=ts
Youtube – https://www.youtube.com/user/LotusFeverTV
Bandcamp – http://lotusfever.bandcamp.com/

Entrevista – Pedro Raimundo
Fotografia – Luis Sousa