Backstage

TIME FOR T – UM TOM TOM AVARIADO E A FELICIDADE DOS TEMPOS PERDIDOS

Tom Tom nome de música, mas igualmente marca de sistemas de navegação. O da carrinha dos Time for T não foi o mais amigável. Não os livrou de um acidente na A1, tinham tido concerto no dia anterior nos Maus Hábitos (Porto), e como tal fez com que chegassem atrasados. Cansado e algo temeroso em fazer a entrevista, registo tanto do meu agrado como cerveja quente em dia de Verão, e que me afasta do tom mais informal de uma conversa. Mas, as surpresas acontecem. Palavras, umas atrás das outras e as ideias fluem com a mesma velocidade que as flores dos jacarandás caem algures nas ruas de Lisboa. No final olhar para o relógio, verificar que o tempo voa e que no fundo há sempre boas histórias. A base para as mesmas? A autenticidade.

Música em DX (MDX) – O Tom Tom foi o que vos lixou desta vez?
Tiago Saga (TS) – Um pouco sim. Além de um acidente, o trânsito caótico de Lisboa e o meu desconhecimento da cidade, nasci em Lagos, não se pode fazer muito.

MDX – Como foi o concerto na noite anterior, no Plano B?
TS – Correu bastante bem. Temos uma relação bastante próxima com o pessoal do Porto. Já tínhamos tocado lá no Nos em D’bandada nos Jardins da Cordoaria e a receptividade tinha sido bastante boa. Criámos logo ali o que se pode considerar como um núcleo de fãs e amigos. Desta vez foi menos gente, uma Quarta-feira, o facto de se pagar e o pessoal andar curto de guito, mas mesmo assim muito bom.

MDX – E o que se pode esperar para o concerto do Musicbox?
TS – Pelo menos uma hora e meia, duas horas sempre a tocar, de preferência tocar até mais ninguém querer ouvir (risos). Sobretudo que haja um grande entusiamo, pelo menos da nossa parte há.

MDX – Que episódios mais pitorescos podes contar e que te tenham acontecido numa digressão?
TS – Tocámos em Inglaterra, Alemanha, em Portugal e Espanha. Mas durante a quarta digressão e após o nosso concerto do Sudoeste, tínhamos um dia livre. Através do Facebook perguntámos por um sítio para tocar. Numa terreola no sul de França responderam que estariam disponíveis para nos acolher. Era uma Segunda-feira à noite, numa aldeia de surfistas. Estava vazia. De repente chegam as pessoas e começam a curtir, até que de repente e, sem esperarmos, começam a andar à batatada. Na mesma digressão, em Paris numa casa muito bonita com jardim – concerto e beber um copo e outro, quando dêmos conta faltava menos de uma hora para apanhar o barco de volta a Brighton. Chegámos dois minutos antes. Hum, sorte.

MDX – Notas diferenças de país para país?
TS – Em Portugal parece haver mais distância entre os músicos e os espectadores. Talvez uma maior respeitabilidade dos espectadores face aos músicos. Em França e quando se junta o facto de ser à borla parece que todos ficam mais eufóricos. Em Inglaterra, e em Brighton em particular, como mais de metade da cidade são músicos ou artistas, sente-se uma maior proximidade. É como tocar para uma grande comunidade.

MDX – Já têm um largo historial em tocar em Festivais. Como é? Não vos parece que é sempre demasiado curto, demasiado formatado?
TS – Adoramos tocar em festivais, é sempre um stress bem-vindo. Se for possível tocar à noite tanto melhor, mas desde o Sudoeste, mais para putos, até ao Super-Bock as experiências têm sido bastante boas.

MDX – Como foi o processo de gravação destes novos temas?
TS – O nosso objectivo é gravar um LP. O primeiro EP foi bastante caseiro. Eu a solo com o Rafael que foi o produtor. Os temas eram algo dramáticos e grandes, mas senti a necessidade de tocar numa banda, num grupo de amigos, isto em 2012. Em 2013 gravámos 3 canções. É o nosso álbum escondido. Não gostámos do resultado. Estava mal produzido, ou seja os momentos para fumar erva foram mal escolhidos (risos). A partir daqui decidimos outra abordagem. Recorremos ao crowdfunding, trabalhámos com um produtor mais do nosso agrado e o processo foi mais directo – bateria e baixo em registo vivo, old school, vozes e guitarra mais calmas, sem necessidade de recorrer ao metrónomo. Derivámos para um tipo de som mais pesado, talvez da nossa maior experiência de tocar ao vivo, e que resulta melhor.

MDX – Há um livro de Jonathan Coe (The terrible privacy of Maxwell Sim) em que o protagonista se apaixona pela voz do GPS. Também foi o vosso caso quando escreveram Tom Tom?
TS – A voz tem um sotaque horrível, mas é útil nas digressões. Por vezes o GPS não funciona muito bem, o que é óptimo. O melhor é quando acontece o que não estás à espera, sem plano, permite-nos ir a lugar desconhecidos. Este tema é contra a imposição tecnológica. E que tal começar uma conversa com um local e quem sabe casar? É pedir ao Tom Tom que nos leve a um céu azul. A felicidade dos tempos perdidos.

MDX – Nota-se um certo carinho vosso pelo formato canção.
TS – Sim, o processo de criação da música começa comigo. Ora mais desenvolvido, outras vezes menos. A partir de uma ideia, melodia a banda começa a criar. Estudei composição de música em Brighton e o curso foi-me bastante útil. Perceber o que fazer com as canções. Há influências que terei para sempre como o Dylan ou a Mitchell, criar melodias. No fundo, é como transpor a magia do mundo. A música é uma coisa muito mágica, ficar surdo seria o meu maior pesadelo.

MDX – Qual o ingrediente para uma canção perfeita?
TS – Ser natural, ser puro. Quando sai de ti, de quem compõe. Ter os cozinheiros certos também ajuda, um bom groove, uma história que queiras transmitir, uma melodia diferente mas que de certa maneira seja memorável. Nunca fazer o mesmo, ter a vontade de mudar. Fazer sempre igual é não só repetitivo como faz com se perca um certo lado de pureza.

MDX – Quais as vossas influências (não necessariamente musicais)?
TS – Para lá do Dylan e da Mitchell ouço muito músicas do mundo, afrobeat e o legado do Fela Kuti. Mas também a necessidade de mudança, as notícias, o que se vê quando se anda de comboio, as conversas que ouço quando trabalho no bar, a amizade, um certo acorde. O amor e o ódio, a família que talvez seja a síntese destes dois sentimentos, a ambição em querer fazer melhor.

MDX – Que diferenças entre Brighton e Lagos?
TS – Todos devem sair de sua casa. Há uma necessidade de nos reinventarmos. Fazer o corte e começar de novo. Criar como que um novo zero. E de repente tudo explode. Lagos pode ser muito interessante de Verão, no Inverno nem tanto. Há como que um lastro. És conhecido não pelo que és, mas pelas imagens que as pessoas fazem de ti. Há como que uma cristalização. Houve uma altura em que decidi partir, criar o corte. Candidatei-me ao curso em Brighton e fui aceite. Aí metade da cidade é ligada às artes, é como uma espécie de grande comunidade. Há uma vontade em criar, de fazer alguma coisa de novo. Criámos os Time for T entre amigos. É pegar em dois ou três e começar a tocar. Flui naturalmente. Por exemplo, tocámos no The Great Escape 4 vezes em 2 dias.

MDX – Já tocaram nas sessões lusco-fusco para a Tradiio. Qual é a vossa relação com a Tradiio e como veem este tipo de plataformas?
TS – É muito interessante. É uma maneira inovadora de ouvir música. Se for bom para o ouvinte e bom para o músico. Pode ser o futuro da música.

MDX – E o caminho? Quais as próximas direcções?
TS – Vai ser um Verão preenchido, com 4 a 5 festivais na Alemanha e Inglaterra, voltar cá em Agosto e lançar o LP, fazer uma digressão na américa ou simplesmente aparecer numa cidade em que nunca estiveste e tocar por lá.

O dia acabou com o concerto da banda no Musicbox Lisboa, e o Música em DX também esteve por lá. A reportagem será disponibilizada em breve.

Entrevista por – João Castro
Fotografia – Time for T