2015 Festivais Reportagens Vodafone Paredes de Coura

Vodafone Paredes de Coura’15, dia 20: Tame Impala, a ansiedade, o fenómeno e o psicadelismo

O dia que levou o festival a esgotar pela primeira vez em toda a sua existência, fez jus a esse facto e revelou-se um dos dias mais completo e rico de todo o cartaz. Desde o palco secundário (Vodafone FM) ao principal (Vodafone) a qualidade ia transbordando e era impossível a satisfação não estar refletida nos rostos.

Hinds

As madrilenas também conhecidas por Deers (no passado), regressaram a Portugal e iniciam o aquecimento de uma noite que vai ficar para a história. A energia e boa disposição que as acompanha conseguem contagiar o público já composto que assiste ao concerto, contudo não é suficiente para colmatar a falta de garra e maturidade das vozes que, embora funcionem bem em estúdio, em palco já não acontece. Instrumentalmente, conseguem construir um verdadeiro rock de garagem, com uma bateria bastante potente, mas nada trouxeram de melhor ou novo relativamente ao último concerto dado em terras lusas. Ouviram-se temas como “Bamboo”, “Trippy Gum” e “Castigadas en el Granero”.

peixe:avião

Entretanto, os peixe:avião inauguram o palco principal, tanto na carreira, como no dia. Com um pano de fundo composto por quatro linhas brancas na vertical, à frente dos seus olhos o relvado inclinado vai-se compondo. Os bracarenses dotados da sua união e introspeção característica, oferecem um estilo único banhado por rock progressivo e experimental, tocando êxitos como “Pele e Osso”, “Avesso” e “Torres de Papel” onde se realça o papel do sintetizador. Apresentam ainda um tema novo ao qual ainda não atribuíram nome, tema que o público abraça com enorme satisfação.

POND

Numa correria, as pessoas vão enchendo o palco secundário que se tornou num espaço pequeno para tanta gente. Os POND vinham com vontade de revolucionar o recinto e contagiar os festivaleiros com a sua boa disposição e excelente performance musical. A banda que caminha de mãos dadas com os Tame Impala mostrou que já era crescida e sabia para o que vinha. A união dos riffs de guitarra com os sintetizadores transforma o rock psicadélico que tocam numa viagem daquelas que nos leva ao espaço. E por falar em espaço, vieram apresentar o novo álbum lançado no início de 2015 – Man, It Feels Like Space Again – excelente candidato a um lugar no top dos melhores do corrente ano. Entre as faixas escolhidas encontravam-se “Waiting Around For Grace”, “Elvis’ Flaming Star” e “Man, It Feels like Space Again”, faixa com que terminaram 45 minutos de caminhos intergalácticos.

Steve Gunn

O cantautor americano, que pertence aos The Violators que acompanham Kurt Vile preparou-se para nos guiar pelos caminhos da folk e do country acompanhado da sua guitarra acústica. A voz branda e tranquila entrou nos ouvidos de fininho e acalmou os corações que vinham em delírio do concerto anterior. As faixas eram longas e mantinham um mesmo registo, conservando a linha ténue e coerente. Entre o alinhamento encontrámos “Old Strange, “Wildwood” e “Way Out Weather”. A tarefa foi cumprida e os sentidos estavam preparados para o que vinha a seguir.

Father John Misty

Ninguém sabia o que estava prestes a acontecer, mas o compositor e escritor americano preparava-se para fazer história em cima do palco. Acompanhado do seu estilo folk e country-rock, Joshua Tillman ou Father John Misty transforma-se num encantador de almas. Meio teatral, a sua postura de sex symbol interliga-se em perfeita comunhão com as letras que canta e com a escolha sábia das melodias. Arriscaria apelidá-lo de um novo génio da música e ele sabe disso, a sua confiança transparece em cada gesto que faz ou em cada passo que dá. A harmonia com a plateia era perfeita e esta estava envolta numa espécie de abraço de romantismo e encanto. O concerto iniciou-se com a música que dá nome ao novo álbum lançado este ano – “I Love You, Honeybear”, passou por caminhos mais sarcásticos como “Bored in the USA” e alguns mais conhecidos como “Chateau Lobby #4”. Terminou o concerto contrariando toda a ligação que tinha criado com público, não dizendo uma única palavra de despedida.

The Legendary Tigerman

Não é novidade que Paulo Furtado é dono de uma capacidade feroz de dar concertos arrebatadores. Nesta noite, não houve exceção. Paredes de Coura aguardava-o com muita fome do seu rock’n’blues. Mal pisa o palco, afirma que é bom regressar a casa e ouvem-se os acordes de “Do Come Home”. Pela noite dentro os duelos entre a guitarra e o saxofone de João Cabrita vão aumentando de intensidade trazendo a loucura para o público. Desde “Wild Beast”, passando por “Nacked Blues” e “Bad Luck Rythm’N’Blues Machine” terminando com o clássico “These Boots Are Made For Walking” e “21st Rock’N’Roll” o crowd-surfing era uma constante. Com a última música, o microfone perdeu-se entre o público nas mãos de alguém que, já rouco, gritava “rock’n’roll”. O público rendeu-se e o homem tigre foi Rei.

Tame Impala

Chegou a hora dos que fizeram esgotar o 2º dia do festival. No espaço de escassos 4 anos, os Tame Impala passaram do desconhecido para a boca do mundo e percebe-se porquê. Desde Innerspeaker a Currents, passando por Lonerism a evolução é notória e constante. A genialidade que está por detrás de Kevin Parker é majestosa. Não admira que em cada ano que regressam a Portugal, a audiência seja cada vez mais elevada. Mas Kevin admira-se e passou a hora e meia de concerto (o mais longo do festival) a agradecer humildemente aquilo que estava a acontecer. A música, mais sintética hoje que no passado, mas ainda com a textura psicadélica com que se deram a conhecer conseguiu despertar nos espectadores momentos de prazer, viagem e enorme satisfação. Aquele anfiteatro formava um sorriso gigante e ninguém queria sair dali, o que estava a acontecer era mágico. Embrenhados em imagens com figuras geométricas e formas descoordenadas cobertas de néons os Tame Impala deram tudo, trouxeram um pouco de cada álbum: “Why Won’t You Make Up Your Mind?”, “This Is Not Meant To Be” e “Alter Ego” de Innerspeaker, “Why Won´t They Talk To Me?”, “Elephant” e “It Feels Like We Only Go Backwards” entre outras de Lonerism e claro, “Let It Happen”, “Eventually” e “’Cause I’m a Man” de Currents. Houve ainda direito a um encore não planeado, mas muito bem tocado. Após o que se presenciou, ficou a certeza de que Portugal e Tame Impala irão caminhar unidos por alguns anos.

Existia uma sensação gratificante no ar, este dia foi importante para a história de paredes.

Texto – Eliana Berto
Fotografia – © Hugo Lima | Vodafone Paredes de Coura