Duas semanas. Duas mulheres, duas músicas, duas performers. Sobretudo duas abordagens radicalmente opostas. Se sensivelmente há quinze dias nos deparamos com o deslumbramento cósmico de The Space Lady, o capacete rematado com luz vermelha intermitente, as asas de Mercúrio a libertar-nos de qualquer temor para cavalgarmos cavalo em Western projectado e sobretudo as composições e diferentes versões de Major Tom, I Had Too Much to Dream Last Night de The Electric Prunes, e que versão logo para segundo tema, e os originais The Ballad of the Captain Jack e Synthesize Me, há uma semana, mais uma vez no aquário da ZDB, assistimos a outra perfomer, de seu nome Jana Hunter. Se com Space Lady não há nem baixo, nem cima, nem esquerda, nem direita, poderíamos afirmar que The Space is the Place, com Jana Hunter líder dos Lower Dens há um centro gravítico bem definido – ela mesma.
Camisa preta e calças da mesma cor. Cabelo rapado e guitarra em punho, numa postura quase marcial. Não há gritos de guerra, nem muito menos grandes elaborações linguísticas entre as músicas. No registo austero que se lhe conhece vai desfiando os temas num ritmo irrepreensível e sempre bem acompanhada. Dream pop, indie pop é como frequentemente catalogam esta banda de Baltimore, que tantos nomes nos tem dado e visitado – Beach House e Dustin Wong, Dope Body, Matmos mais recentemente e Future Islands e Dan Deacon o ano passado. Dream pop, indie pop mas com tintes mais soturnos do que os habituais, a recordar paisagens cinematográficas como as de Drive (Nicolas Winding Refn). Camadas densas que obrigam a uma audição atenta. Desde de To Die in L.A., Ondine, Quo Vadis do mais recente e aclamado álbum – Escape from Evil (2015) a temas de álbuns anteriores como Brains do Nootropics (2012) ou I get nervous do primeiro trabalho (Twin-Hand Movement – 2010). As passagens são subtis e acontecem entre delicadezas rítmicas conferidas por uma linha de baixo mais presente ou, noutros momentos, por camadas eletrónicas mais evidentes.
Jana Hunter de camisa preta e cabelo rapado, a recordar estética de tribos urbanas dos anos 80. Regressos e muitos nesta noite. Não só na indumentária, não só da banda, tocou pela última vez na ZDB há 5 anos, mas também de cada um dos seus elementos isoladamente, tinham lá tocado há 9 e 10 anos. Volta a uma sonoridade que vem sendo cada vez mais revisitada, várias vezes, entre o público se ouviu o nome Savages, mas também a uma postura e maneira de estar em palco a fazer lembrar Manchester pré Hacienda. Jana Hunter abandonada a guitarra, por vezes, e dá início a contorções várias, os rodopios de cabeça e o “arranhar” do palco que ficarão sempre na memória, a fazer lembrar, como sloogan de programa radiofónico que todos nós temos um lado sombrio.
Texto – João Castro
Fotografia – Luis Martins (Galeria Zé dos Bois)