Era dia 11 e o último dia de festival começou com uma Apresentação da Eurosonic Noorderslag promovida pela plataforma Why Portugal, com acesso restrito. A apresentação contou com a presença de Peter Smidt, Álvaro Costa e Nuno Saraiva. Nela, revelou-se a essência do projecto e aprofundou-se o propósito da partilha e divulgação da música europeia, sendo que, em 2017 Portugal vai ser o país a ter destaque naquilo que é a maior feira profissional e festival de música da Europa – o Eurosonic Noordeslag. A Antena 3 é a rádio oficial em Portugal e, de Setembro a Dezembro do corrente ano vai ter uma programação especial que vai incidir sobre o Eurosonic. Todas as bandas podem candidatar-se na plataforma: http://www.eurosonic-noorderslag.nl/en/. O Festival vai acontecer de 11 a 14 de Janeiro em Groningen, na Holanda. Aproveitem a oportunidade e levem a música que se faz em Portugal mais longe.
Terminada a sessão de esclarecimento, era tempo de regressar às viagens entre palcos! Desta vez com um sol quente e um cansaço maior.
Linda Martini
Aos poucos o público ia-se amontoando para receber os pais de Sirumba. Era uma óptima oportunidade para saborear o novo álbum e ver como resulta ao vivo. A verdade é que, com o passar dos anos, os Linda Martini mostram uma estrutura musical mais coesa e trabalhada. Entre as músicas novas: “Sirumba”, “Unicórnio de Santa Engrácia” e “Putos Bons”. Entre as músicas antigas: “Juventude Sónica”, “Amor Combate”, “Panteão”, “Ratos” e “100 Metros Sereia”. Todas elas fizeram as delícias dos presentes, que berravam as letras com o peito cheio. A bateria de Hélio é um autêntico furacão! E os riffs acompanham a melodia das letras curtas. Não houve encore mas Hélio terminou com um stage diving enquanto os seus companheiros abandonavam o palco.
Neil Michael Hagerty & the Howling
O que estava prestes a acontecer no Palco era algo estranho. Aquilo que se esperava um concerto com uma boa ripada de rock não foi mais que um episódio desconcertante. Em palco três sujeitos pareciam experimentar sons. Uma guitarra distorcida e algo apetecível safava um cenário que roçava a decadência. A voz mal se ouvia e pouca força tinha parecendo, por vezes, que o senhor sussurrava. O som era demasiado sujo e seco. Ouvia-se entre o público “a droga é boa” e, sinceramente, era o que parecia. Em cima do palco eram só os corpos que marcavam presença, o resto parecia viajar num espaço qualquer que não era o nosso. Nem com a faixa “Mountain” o público despertou ou mostrou interesse no que se passava em cima do palco.
Chairlift
Depois de uma prestação que deixou o público descontente no Vodafone Mexefest’15, os Chairlift devem ter chegado à conclusão que o último álbum pouco resultado tinha ao vivo. Assim, com um cenário diante dos olhos totalmente diferente, decidiram aproveitar o final de tarde para trazer boas energias e ritmos saborosos. Uma synth pop alegre com traços glamorosos saia pelas colunas e faixas como “Amanaemonesia”, “Romeo” e “Bruises” plasmaram sorrisos nas caras dos presentes, tendo o ponto alto sido atingido com a cover “Song To The Siren” de Tim Buckley.
Autolux
Após uma pausa de 6 anos no lançamento de álbuns, os californianos Autolux regressam com uma alma nova e adaptada aos tempos modernos. Na bagagem, Pussy’s Dead e um dream pop com algumas tonalidades suaves de shoegaze e experimentalismo. As distorções comandam e Carla, na bateria, dá voz (profunda e aveludada) e ritmo ao espectáculo. Ondas sonoras sensuais, apaixonantes e algo perturbadoras chegam até nós e arrastam-nos para dentro de uma bolha sonora confortável.
Battles
Por falar em experimentalismo, seguia-se o concerto electrizante dos novaiorquinos Battles. Paralelismos mentais e explosões auditivas sentiam-se por todo o espaço do Palco Super Bock. As distorções eram desconcertantes e extasiantes e iam crescendo a ritmos alucinantes. Estes 3 rapazes têm um grande poder a sair-lhes do corpo e esse poder contagia todos à sua volta. Os espasmos surgiam descontroladamente e o pensamento diluía-se por entre camadas e camadas de densidades e construções encorpadas. Um grande concerto para se assistir e deixar-se levar. A percussão e os sintetizadores mesclam-se numa harmonia perfeita que se pincela com riffs esquizofrénicos. Um concerto melhor que o de Barcelona, disseram eles. Não sabemos como foi lá, mas no Porto foi muito grande.
Drive Like Jehu
Este último dia de festival parecia vir sempre em crescendo, subindo a intensidade e força de concerto para concerto. Drive Like Jehu estavam prestes a dar um dos melhores concertos do dia. A sagacidade e o post-hardcore destes californianos escorria-lhes pela testa. A sonoridade oscilava entre o referido post-hardcore, o punk e o math rock, trazendo um ritmo rápido e fugaz capaz de criar dores no pescoço. A voz, tal Kurt Cobain em diversos sentidos, era rouca e arranhava, tal como a crueza do som. A intensidade atingia picos e descia a pique conseguindo desnortear as almas e os corpos presentes. Malhas atrás de malhas a satisfação estava espelhada nos rotos iluminados pela pouca luz existente e subia pelas cabeças com crowdsurfing intenso. Ouviram-se, entre outras, “Human Interest”, “Atom Jack”, “Here Come The Rome Plows” e “Bullet Train To Vegas”.
AIR
Um choque assomou-me e caí bruscamente por uma falésia a baixo. Para aparar a queda sentei-me na relva. Eu e centenas de pessoas. Um concerto parado, suave e sensual trouxe um momento de chillout e de relaxamento. Apesar da maturidade, os AIR só são capazes de dar bons concertos numa sala, infelizmente. A voz, cristalina e elegante, misturava-se com os sintetizadores e as teclas suaves, mas não tinha energia suficiente para fazer as pessoas se moverem. As faixas “Venus”, “Playground Love” e “Sexy Boy” trouxeram memórias e imagens mentais que nos fizeram perder o olhar no céu, mas não levantar do chão. Foi um concerto bonito mas pouco intenso.
Explosions In The Sky
Se havia coisas a arrumar ou desarrumar na cabeça, esta era a hora. Havia 3 rapazes à nossa espera no Palco Super Bock e tinham bilhetes de viagem com vários destinos, alguns certos outros incertos. Este trio, para além de criar explosões no céu, criou explosões nas nossas cabeças. Explosões essas que se transmutavam em prazer. Donos de um post-rock instrumental com nuvens negras de shoegaze fizeram com que a hipnose vencesse perante uma vasta audiência. Sensações bonitas e arrepiantes foram sentidas intensamente por entre as faixas longas e trabalhadas.
Ty Segall and The Muggers
Poderia apenas dizer que este foi o melhor concerto do dia e do festival todo. No entanto, apesar de serem palavras fortes e de dizerem tudo resumidamente, não fariam jus ao espectáculo grandioso que se assistiu naquele palco perdido no meio do mato. Ele era o maestro e eles os Muggers (seis no total) e entraram em palco de fato de macaco como sendo um presságio de que precisaríamos de uma reparação mental após o concerto. Ty Segall, trazia na mão o boneco que ilustra a capa do novo álbum – Emotional Mugger – e um choro distorcido de criança dava início ao banquete. A ementa era composta por puro rock’n’roll, glam rock, rock de garagem e até umas linhas de punk rock. A carta onde vinha a ementa denominava-se sabedoria e nós, os degustadores, meros aprendizes. Apresentou, de rajada o fantástico último álbum, tocando 6 músicas seguidas de “Squealer”, passando por “Emotional Mugger/Leopard Priestess” e parando em “Candy Sam” e “Squealer Two” que colou uma à outra. A terminar, 4 faixas de Manipulator e a grandiosidade de um génio. Não estivesse já a ser um momento perfeito em tudo o que o caracterizava que ainda reproduziram a “L.A. Woman” dos The Doors. Quase a chegar ao fim do concerto, uma chamada de atenção aos seguranças, que deveriam tratar melhor as pessoas. Talvez a recepção do crowdsurfing não estivesse a ser a melhor.
Uma vénia até ao chão a este grande senhor e aos seus assaltantes, que trouxeram o melhor do rock’n’roll, a melhor presença e performance e o melhor de tudo num concerto que, tão cedo, não irei esquecer. Eu e a maioria dos presentes.
Shellac
Como não consegui deixar Ty Segall para trás, só apanhei 2 músicas do concerto dos habitués Shellac. Não foi preciso mais para ficar inquieta. O som que tocam é pesado, negro e perturbador. São loops constantes de riffs que se reportam a um tempo indeterminado. A voz é grave, astuta e pouco usada. A melodia junta-se à voz e cria uma poética densa e viciante. Percebe-se bem porque são presença assídua!
Resta-me congratular a organização do NOS Primavera Sound por tudo o que conseguem construir, tanto a nível de ambiente como de cartaz. O recinto é sublime e o uso de copos recicláveis, este ano, ajudou a mante-lo assim. A comida é diferente e variada e no espaço do recinto encontramos vários pontos de ajuda para tudo o que precisemos. Sentem-se boas energias a circular no ar e, apesar do sistema de som não ser dos melhores e ter algumas falhas, posso dizer que é um dos melhores festivais que Portugal tem.
O cartaz, não fugindo ao estilo alternativo, prima pela diversidade e qualidade. Posso concluir, claramente, que a América é dotada da melhor música desde sempre e para sempre! Obrigada por estes três dias de satisfação de prazer auditivo.
NOS Primavera Sound’16 Dia 09
NOS Primavera Sound’16 Dia 10
Texto – Eliana Berto
Fotografia – Hugo Lima | NOS Primavera Sound 2016 <> Bruno Pereira e Hugo Adelino | WAV Magazine