Opinião Reviews

Toulouse e os termómetros de Yuhng, os novos medidores de temperatura

Dias chuvosos e friorentos, como aqueles que têm abalado todo o Portugal Continental, são sinónimo de mantas quentes, chocolate-quente e uma lareira com a dose certa de lenha; nestas alturas, o nosso adota uma necessidade materialista por coisas que nos aqueçam a alma. Para nós, amantes de música, haverá melhor remédio para a entrada do inverno do que um disco que tem tanto de caloroso como de relaxante? Preenchendo esta vaga está Yuhng, o novo disco dos Toulouse, o quarteto português oriundo de Guimarães. De facto o álbum foi lançado ainda nos inícios do outono, mas é agora nos seus fins que todo o seu esplendor desbrocha ao longo de pouco mais de meia hora de canções.

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À primeira vista, é impossível não felicitar a banda por terem conseguido conciliado a genuinidade e a pureza típica de artistas novatos, que só querem dar a conhecer o seu trabalho, com a competência e a segurança daqueles que andam nisto que é a música já faz tempo. A confiança com que João Silvestre, Rui Pacheco, Nuno Duarte e Francisco Naylor se atiram às suas canções prova não só maturidade como um grande à vontade com o tipo de sonoridade que possuem: estão confortáveis dentro do seu mundo, onde reinam e são líderes soberanos.

As primeiras audições de Yuhng remetem-nos ao universo dos norte-americanos DIIV, com o estilo indie rock entre ambas as bandas a serem deveras semelhantes; atrevemo-nos a dizer que quem gosta dos autores de “Dopamine”, os Toulouse não lhes ficarão indiferentes. Contudo, e como os próprios portugueses de intitulam, estes últimos preferem identificar o seu género musical como smooth punk, algo como uma agressividade suavizada e domesticada, sendo aqui que se nota a principal diferença face à banda de Zachary Cole Smith: um som muito mais controlado e contido, com uma veia um pouco mais relaxante à mistura.

Yuhng é um disco que (quase) exige ser ouvido num todo, com os seus oito temas a funcionar como uma das mais agradáveis listening sessions de que há memória em tempos recentes. Depois de um loop intensivo a que este nos obriga – não nos importamos nada de ser impingidos por este tipo de ordens – é possível categorizá-lo em duas partes: a “calma” (de “Parhelia” a “Doe”) e a “tempestade” (“Juniper” até “Sonder”). Visto que “depois da calma, vem a tempestade”, frisa-se novamente que a segunda metade do disco é uma consequente da primeira, não como um complemento mas sim como a continuação do trajeto até aí percorrido, havendo todavia um desvio para um ritmo mais alucinante em contraste com o ambientador que o sucedera. De uma forma sintetizada, a primeira metade do álbum cria um tom apaziguador que é subitamente transformado numa vertente mais punk, embora a ternura característica dos Toulouse lá permaneça (e encante). Contudo, e aí reside o único pecado do disco, este acaba repentinamente no deslumbre que é “Sonder”, o que nos levava a pedir mais um tema que tivesse um maior encaixe de música término. Quiçá esta decisão não tenha sido propositada com o intuito de nos remeter para a faixa inicial que é “Parhelia” e ouvir Yuhng novamente; se assim o for, estes rapazes conseguiram essa missão com sucesso.

No final do dia, os Toulouse assinaram uma formidável estreia em formatos de longa duração com Yuhng, um disco que demonstra a sua qualidade enquanto banda e assegura-nos que há aqui um futuro promissor para os moços de Guimarães. Depois de “Ghyll” e “Battery” terem hipnotizado o nosso botão de replay, assim como o álbum inteiro, era tempo de olhar pela janela fora e reparar que a chuva desaparecera, o cacau esfriava e a lenha da lareira apagara-se. A temperatura da sala de estar estava mais acolhedora, sim, mas era dentro de nós que residia o calor central, calor este cedido por meia hora de canções que, ao fim ao cabo, tornaram-se em duas horas bem passadas e uns quantos repeats agradáveis.

O disco pode ser ouvido integralmente no bandcamp da banda.

Texto – Nuno Fernandes