Em noite de catarse temporal houve uma lagosta que deu à costa. Por baixo da sua casca trazia a essência do blues e o sabor do rock. As suas pinças serviam para nos beliscarem e fazer crer que aquele era o sítio onde queríamos estar. O sítio era o Popular Alvalade e a lagosta, de nome Billy Lobster, veio aquecer-nos numa noite fria e chuvosa e provar que o luxo da sua textura não serve apenas de alimento corporal, mas também de alimento da alma.
Foi na passada sexta-feira, dia 4, que esta conceituada sala recebeu Billy Lobster em jeito de apresentação do seu primeiro trabalho: Boogie on the fly.
Pavel Racu é um conquistador! Tanto na melodia como no encanto com que encara o público. Desde que pisou o palco que a empatia foi geral e se estabeleceu de imediato uma relação de confiança entre ele e nós. A sua postura descontraída, afável, simpática, brincalhona e um tanto ansiosa proporcionou-nos, ao longo da noite, momentos de descontracção, riso e harmonia.
Para o mote de partida este one-man-band, que usa todas as extremidades do seu corpo para fazer música, partilhou o palco com João Luz e a sua harmónica. O momento, que já tinha um abraço de magia, tornou-se arrepiante quando Pavel encostou os lábios ao microfone. A voz sólida, grave e rouca cria formigueiros e vontades de a sugar, tornando-nos todos num só.
Os acordes simples e intrigantes que saiam da guitarra faziam com que a introdução da música se ramificasse em prazer e inquietação. A partilha do momento com a harmónica fazia-nos sentir iluminados pelo brilho das estrelas enquanto caminhávamos pelo deserto complexo de sentimentos que tínhamos à nossa frente. E é sobre desertos precisamente que fala esta primeira música, “Desert song” divide-se em várias partes, vários sentimentos e vários compassos e ritmo.
A ideia era seguir o alinhamento do disco, uma vez que se tratava da sua apresentação, que tinha sido especialmente escolhido dessa maneira e era como fazia sentido ser tocado. Entre as músicas, histórias sobre música, amores, desamores birras e pianos imaginários, fomos saboreando álbum que respira rock’n’blues e a paixão pelo ritmo. Contámos com a presença de João Luz, para além da primeira canção, em “Homemade blues” e “She’s been busy hatin’ me”. Na “There’s no reason” o encanto foi partilhado com a voz delicada e firme de Catarina Cardoso. O uso sábio de bombo, pratos, guitarra e voz pela mesma pessoa, consegue transformar o simples numa complexidade de sabedoria. A dança era inevitável!
Pavel termina com “I’m not in the mood” afirmando que estava mesmo no mood naquela noite! Ele e nós! Após alguma insistência toca mais uma música, desta vez de Mississippi Fred McDowel – “You Gotta Move” acompanhada de harmónica. Cabe-nos realçar o papel da harmónica tão bem desempenhado e tocado ao longo da noite.
Billy tocou com a magia de quem tem o talento a escorrer-lhe pelo corpo e proporcionou-nos uma noite quente e especial tal como este Boogie on the fly que pode ser ouvido aqui: https://billylobster.bandcamp.com/.
Texto – Eliana Berto
Fotografia – Luis Sousa