Estiveram em Portugal na passada edição do Reverence Valada, no entanto os concertos de festivais são muito diferentes da situação em que agora os reencontramos. Ter a banda ao nível dos olhos ou ao alcance da mão é comparável a estar de facto noutro planeta com eles.
Os Mars Red Sky estiveram na passada sexta-feira dia 12 de Maio em Lisboa, depois de, na noite anterior terem tocado na cidade do Porto. Trouxeram até nós um pouco da sua visão do mundo a partir de Marte. Podíamos descrever esta paragem no Sabotage Club como um concerto intimista mas inclinamo-nos mais para o lado introspectivo e melancólico da viagem espacial até ao céu do planeta vermelho, não a intimidade da banda com o público por causa do espaço, mas a comunhão ao sentir o som que nos envolve completamente.
Estes rapazes franceses são exímios criadores de ambientes e representam o que neste momento se faz de bom stoner psicadélico na Europa. Já estão num patamar que lhes confere um certo estatuto, que torna esta passagem pelo clube do Cais do Sodré algo insólita mas altamente satisfatória, e sobretudo agradavelmente surpreendente para aqueles que ali se encontram e já há algum tempo vinham reclamando um concerto do trio de Bordéus em Portugal.
O público compareceu à chamada e o clube encontrava-se lotado para os receber. Podia ler-se nas caras do vocalista Julien Prase, Jimmy Kinast, baixista, e Matgazz baterista alguma surpresa e uma serena felicidade com este mar de gente que preenchia todos os espaços possíveis do clube para os ver.
A projecção de imagens, sob o pano de fundo do palco, que inclui desde cavalos a correr a naves a ascender na atmosfera, árvores a serem fustigadas pelo vento ou meros jogos de cor e luz tão próprios nestes ambiente valoriza muito o trabalho dos Mars Red Sky que construíram sobre essa tela um concerto que foi sempre subindo de tom, empatia e intensidade sensorial, amplificado pelo jogo de luzes e projecção que levou toda massa humana a render-se perante a aura cósmica da banda.
Um público feliz, foi o que o trio francês encontrou ao subir ao palco para tocar numa versão ainda mais longa de Alien Grounds/ApexIII, a primeira faixa do último disco. A viagem começou assim num sereno crescendo, em que o público ondulava como se estivesse submerso numa piscina quente, outros dir-se-ia estavam já onde a gravidade é nula.
Na construção desta metáfora alusiva ao céu do planeta vermelho e deserto, sobre a qual consumam a sua sonoridade, é estruturante a habilidade de construir poderosos riffs de guitarra, que quase obliteram a voz de Julien mas que a deixam exactamente no ponto do limbo espacial onde ela deve permanecer. O espaço como objecto lírico presente também em Strong Reflexion do aclamado disco homónimo de 2011. “Dead stars are burning in the sky” canta Julien e com ele o público, que sorri feliz, à medida que o ritmo cadente e poderoso do baixo de Kinast aumenta de intensidade em sintonia com a bateria do esguio Matgazz.
Na tela sucedem-se imagens que nos desafiam a sentir a indiscutível dicotomia entre a melancolia cósmica e a universalidade desse mesmo cosmos do qual todos fazemos parte. Um convite à introspecção cósmica com The Light Beyond e Hovering Satellites com o arrastar crescente dos riffs da guitarra de Julien a gritar deserto por todos os acordes,e a bateria de Matgazz num crescendo poderoso, facilmente fazendo esquecer que partilhámos quase duas horas da nossa vida dentro daquele espaço. Num ápice cósmico de gravidade nula, Shot in Providence e Up the Stairs, completam o périplo ao céu do planeta vermelho.
Os Mars Red Sky são possuidores de uma rara capacidade de saciar o público através de um abraço cósmico que os arrebata sem aviso e foi isso que nos trouxeram, sem mais artifícios. A promessa cumprida aplaudida por todos, numa gratidão imensa pela viagem proporcionada.
Aguardamos notícias de outras viagens. Mandem fotos do céu de Marte.
Texto – Isabel Maria
Fotografia – Daniel Jesus