Está oficialmente aberta a época dos festivais de verão, tendo cabido ao NOS Primavera Sound a honra de dar o pontapé de saída. Nos passados dias 8, 9 e 10 de Junho, o Parque da Cidade do Porto vestiu-se de verde para acolher os mais de 90 mil festivaleiros que procuravam um refúgio de todas as complicações e stresses que o quotidiano alberga. Impondo-se como um dos “festivais mais bonitos do mundo”, o festival da Invicta é, sem dúvida alguma, um local mágico que consegue oferecer a comunhão total entre a música e a Natureza.
Na última quinta-feira, dia 8, o sol que iluminava o Parque da Cidade revelou-se um pouco tímido em aparecer, ofuscado pelas nuvens que decoravam a paisagem da cidade do Porto. Talvez pela falta do calor típico de um festival a decorrer nesta altura, juntando-se o facto de ser o primeiro dia do evento e muitos dos festivaleiros terem optado por chegar mais tarde ao recinto para deambular pela belíssima cidade do Porto – e que bonita é – o recinto demorou algo a compor-se, o que facilitava a vida ao público madrugador que não teria que esperar muito tempo nas filas para as já clássicas coroas de flores, pinturas faciais e a novidade deste ano: glitter para os homens de barba rija.
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Como bom festival português que é, foi ao som da bela língua de Camões que se fez a estreia dos concertos desta edição do NOS Primavera Sound, onde Samuel Úria tomou as hospitalidades do palco Super Bock, onde já se encontrava uma quantidade significativa de festivaleiros a aguardar pelo cantautor português.
Foi ao som de “Dou-me Corda”, single inaugural do seu último disco Carga de Ombro, que Samuel começou a entreter o público com a sua boa-disposição natural, puxando pelos seus “amigos primaveris” para que o acompanhassem ao longo daquele que, nas palavras do mesmo, “estaria a ser o melhor do concerto do Primavera até ao momento”. Conquistando os presentes com o seu charme natural, Samuel Úria acabou mesmo por assinar um dos momentos mais bonitos do dia quando levou meio público a render-se ao encanto da belíssima “Carga de Ombro”, canção que ganha toda uma outra beleza quando interpretada ao vivo; a música portuguesa foi representada de forma irrepreensível.
Mal a música portuguesa entrou em silêncio, sentiu-se um arrastão enorme em direção ao palco principal do evento, visto que um dos nomes mais apelativos daquele dia estaria prestes a começar: Cigarettes After Sex.
Há algo de místico no projeto liderado por Greg Gonzalez: a forma como a banda se tem vindo a propagar através das redes sociais e de movimentos de ‘passa-a-palavra’ levou a que a mesma chegasse a registos de visualizações incríveis, tanto nas plataformas do YouTube como do Spotify, e a um crescimento de uma legião de fãs já dotada considerável. Apesar de estes reparos serem vulgares em muitas bandas que por aí circulam, o que torna a popularidade dos Cigarettes After Sex tão surpreendente é mesmo a falta de um álbum de originais, optando por lançar temas soltos ou EPs – o primeiro disco Cigarettes After Sex veria a luz do dia na manhã seguinte à passagem da banda pelo Porto.
Ao longo de aproximadamente quarenta e cinco minutos, os Cigarettes After Sex apresentaram todos os seus grandes êxitos que faziam os delírios dos fãs mais acérrimos das filas da frente e saciavam o desejo de música de fundo a toda a multidão que tinha optado por ficar sentada ao longo do anfiteatro do Parque da Cidade a trocar dois dedos de conversa: “Dreaming Of You”, “Affection” ou “Nothing’s Gonna Hurt You Baby” são tão doces de se ouvir em palco tal como no conforto de um lar. Algo apáticos, com ‘obrigados’ na sua língua nativa a soarem pouco convincentes, foram poucas as vezes que se dirigiram ao público, embora tenham-lhes dedicado “Sunsetz” em jeito de antevisão de para o disco que estrearia no dia seguinte. Beneficiando da excelente acústica existente no festival, como se pode comprovar na última música do concerto, “Apocalypse”, os Cigarettes After Sex mostraram o quão fina pode ser a linha que separa uma banda em estúdio e ao vivo, encantando tudo e todos com o seu indie-rock melancólico que demonstra que a afirmação destes tipos enquanto artistas que convém manter debaixo dos nossos radares é mais do que justificável.
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Com o sol finalmente a perder a sua timidez, chegara o momento de testemunhar a segunda presença portuguesa a subir ao palco Super Bock do NOS Primavera Sound: Rodrigo Leão, muito bem acompanhado por Scott Matthew.
Apresentando-se em formato de dupla e com quatro excelentes músicos a acompanhar, o final da tarde fez-se ao som de canções clássicas, em que a poderosa voz do australiano complementava-se lindamente com a banda de apoio do ex-Sétima Legião, onde não faltaram violinos ou trompetes. Com um concerto bem estruturado de forma a dar protagonismo às três individualidades presentes em palco – de realçar a forma como os momentos instrumentais da banda de Rodrigo Leão enchiam qualquer um com um enorme sorriso – o melhor ficou mesmo guardado para o final, em que Scott Mathew lança o desafio ao público de se juntarem a ele e entoarem, em plenos pulmões, uma música que “provavelmente todos vocês conhecem”: nada mais, nada menos do que “I Wanna Dance With Somebody”, de Whitney Houston, com o célebre refrão a unir milhares de festivaleiros. Um momento bonito que evidencia como é que a música consegue unir diversas individualidades.
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Vinda diretamente de Los Angeles, Califórnia, para o Parque da Cidade, a surpresa do primeiro dia do festival dava pelo nome de Miguel Jontel Pimentel, ou simplesmente Miguel.
Conciliando cantorias com sedução, o cantor de R&B não esteve um único momento parado ao longo de todo o concerto, tendo índices de energias que poderiam facilmente ser distribuídos por três pessoas. Logo no início da sua atuação, Miguel quis deixar ponto assente que o seu objetivo era apenas um: o de garantir ao público que eles estariam ali para passar “a good time”. Dito e feito, o americano lança-se a “Sure Thing”, o seu primeiro êxito, onde a entrega e correria ao longo do palco era tanta que levou mesmo o cantor a retirar o seu casaco – com as camadas de fãs das primeiras filas, maior parte estrangeiras, a entrar em histeria com o feito. Decidido a conhecer um público, que o estava a surpreender, perguntou-lhes se gostavam de drogas antes de se lançar a “Do You…”, com projeções psicadélicas a serem exibidas no enorme ecrã do Palco NOS de forma a ir em conta do tema dos estupefacientes.
Com uma carreira que já atingiu a meta dos sete anos de existência, Miguel já traz consigo uma lista considerável de êxitos na bagagem, oferecendo um concerto em jeito de ‘best of’ ao público do NOS Primavera Sound, com os seus fãs mais leais a terem as letras todas na ponta da língua. Comprovado que estava perante uma plateia que sabia cantar, estava na hora saber se sabiam dar um outro passo de dança: em “Adorn”, divide o público em duas frações de forma a ver quem dançava melhor, pedindo para que fossem o mais próximo do chão possível, mas sempre com Miguel a acompanhar. Com uma plateia a delirar e o cantor visivelmente entusiasmado, houve o tempo de recarregar as energias ao som “Coffee”, com o cantor a sentar-se em palco e a cantar com o público, até terminar o concerto com chave de ouro ao som de “waves”, levando a plateia à loucura e a saltar de forma tão frenética e contagiante que conseguiu mesmo levar algumas das pessoas que estavam mais na retaguarda do palco a levantarem-se apenas para aplaudirem Miguel. Sem dúvida, um concerto carimbado com “V” de volta.
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Depois do cancelamento de toda a tournée dos Grandaddy devido ao falecimento do seu baixista, Kevin Garcia, coube aos escoceses Arab Strap ocupar a última vaga do cartaz do NOS Primavera Sound.
Os Arab Strap já andam por estas andanças faz tempo, embora o reconhecimento foi algo que lhes passou parcialmente ao lado… isto até se depararem com um Palco Super Bock cheio pela colina acima, sedento por algo que mantivesse o ‘quentinho’ deixado por Miguel momentos antes. A dupla de escoceses Aidan Moffat e Malcolm Middleton consegue intercalar canções rápidas, músicas instrumentais longas, momentos de spoken word à mistura e, após o seu regresso ao ativo em 2016, uma dose q.b. de eletrónica. Este turbilhão de elementos tudo misturado pode ter suscitado alguns sentimentos de falta de coerência a todos aqueles poucos familiarizados com o trabalho da banda, todavia, a verdade é que muito eram aqueles que não conseguiam controlar os seus pés de dança e abanos de cabeça aos sons da música enquanto agarravam os seus copos recicláveis bem abastecidos de cerveja. Risonhos e simpáticos, o característico sotaque escocês de Aidan Moffat tornava um pouco inaudível aquilo que o próprio dizia, mas era fácil de perceber que a dupla estava a gostar a receção calorosa que a cidade do Porto lhes tinha brindado com, conseguindo manter a reta ascendente que o primeiro dia do NOS Primavera Sound estava a manter até ao momento.
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Se antes de os Run The Jewels entrarem em palco o ambiente do festival estava em altas, a dupla de hip hop não só teve a proeza de assinalar um dos melhores concertos de todo o NOS Primavera Sound como também de remeter o público para o espaço, tal não foi o seu explosivo concerto. Face à magnitude do mesmo, este terá direito a um artigo só seu a ser lançado muito em breve.
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Com o ambiente deixado por Killer Mike e EL-P a revelar-se numa tarefa deveras complicada de superar, a expectativa para o resto da noite era imensa, mas, infelizmente, Flying Lotus, nome artístico para Steven Ellison, não conseguiu estar nem lá perto.
Com a tarefa ingrata de suceder a uma das bandas mais enérgicas e aguardadas de todo o cartaz do Primavera, o produtor americano apresentou-se em formato solo live, contando apenas com um computador, uma mesa de mistura e diversas curtas muito ‘tripy’ a serem exibidas nos ecrãs do palco Super Bock. Estamos perante um artista de renome no que à junção de variados géneros musicais – hip-hop, jazz, eletrónica, música experimental, psicadélico – diz respeito, mas a verdade é que todos estes elementos não conseguiram prender um público que esperava algo mais fogaz, detetando-se, lentamente, muitas pessoas a abandonar a frente do palco para começarem a marcar lugar para os cabeças de cartaz da noite, os Justice. Uma pena.
Para aqueles que fizeram questão de aproveitar todo o concerto de Flying Lotus, certamente que não saíram desapontados, com o produtor americano a apresentar um set repleto de alguns dos momentos mais marcantes da sua já consolidada carreira. Para além de um autêntico espetáculo em termos visuais, Steven Ellison soube utilizar as suas combinações entre estilos para proporcionar um concerto com cabeça-tronco-pés, tendo a perspicácia que faltou aos Arab Strap. Houve, ainda, espaço para uma ou outra surpresa através do uso de samples facilmente identificáveis – juramos que se ouviu o tema principal da série Twin Peaks – que faziam aqueles que se tinham deixado ir nas vibes tripys de Flying Lotus a abrir os olhos e a esboçar um sorriso. Certamente, um concerto que beneficiaria de um horário mais adequado.
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Já o relógio tinha ultrapassado o marco da meia-noite quando as luzes de um palco repleto de colunas – cerca de trinta e seis – e uma cruz enorme a decorar o seu centro, se apagam para que Gaspard Augé e Xavier de Rosnay possam dar início à festa dos Justice.
A dupla francesa trouxe consigo toda a eletricidade dançante que os caracteriza desde que “D.A.N.C.E.” se tornou completamente viral há uns atrás. A partir do momento em que os Justice começaram a soltar os seus hits frenéticos, não houve ninguém que arredasse pé em frente ao Palco NOS, tornando aquela esverdeada colina numa autêntica pista de dança, iluminada por um jogo de luzes incrível que se exigiam ser captadas pelas centenas de telemóveis que andavam pelo ar. Bastava olhar ao nosso redor e os sorrisos nas caras de todos os festivaleiros eram contagiantes, havendo felicidade para dar e vender no Parque da Cidade.
Dividindo o seu set pelos seus três álbuns de originais, a banda beneficiou do facto de ter misturado quase sempre dois temas, um de cada disco, em apenas um, levando a que houvesse muita música para dançar ao longo de hora e meia de concerto e que nos fazia esquecer que o dia a seguir seria de trabalho. Com “Genesis”, “Safe and Sound”, “Fire” e a que todos aguardavam, “D.A.N.C.E.”, os Justice fecharam o primeiro dia do NOS Primavera Sound em tons festivos e premonitórios de que o festival estava apenas a começar.
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Toda a informação sobre o NOS Primavera Sound’17 está disponível no nosso website em Reportagens > Festivais > NOS Primavera Sound 2017 .
Os artigos e fotografias de cada dia estão disponíveis em:
Dia 8
+ NOS Primavera Sound 2017, Dia 8 – O Porto Seguro da Natureza e da Música
+ Nome de Código: R.T.J. (Run The Jewels)
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Ambiente
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Cigarettes After Sex
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Rodrigo Leão & Scott Matthew
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Miguel
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+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Run The Jewels
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Flying Lotus
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 8 Justice
Dia 9
+ NOS Primavera Sound 2017, Dia 9 – O Esplendor de uma Diversidade Pintada em Tons de Verde
+ A Serenata Monumental de Bon Iver
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Ambiente
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 First Breath After Coma
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Pond
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Whitney
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Angel Olsen
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Sleaford Mods
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Teenage Club
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+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Hamilton Leithauser
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 King Gizzard & The Lizard Wizard
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 9 Cymbals Eat Guitars
Dia 10
+ NOS Primavera Sound 2017, dia 10 – No Dia de Portugal, a Festa fez-se no Parque da Cidade
+ O Estado de Guerra de Death Grips
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Ambiente
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Evols
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Elza Soares
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Wand
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 The Growlers
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Shellac
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Death Grips
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+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Weyes Blood
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+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Operators
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 The Black Angels
+ NOS Primavera Sound’17 Dia 10 Against Me!
+info em nosprimaverasound.com
Texto – Nuno Fernandes
Fotografia – Luis Sousa | Hugo Lima NPS 2017 (fotografia de Samuel Úria)
Evento – NOS Primavera Sound’17
Promotor – Pic-Nic Produções