2017 Backstage Festivais NOS Alive Reportagens

A volta ao mundo dos You Can’t Win Charlie Brown

A menos de 20 dias para atuarem no NOS Alive e com encontro marcado para Paredes de Coura também, os You Can’t Win Charlie Brown andam a espalhar a magia do Marrow pelo país. Algo que já acontece desde do ano passado, quando lançaram o seu terceiro disco. O Música em DX encontrou-se com o Afonso Cabral e o Tomás Franco de Sousa para uma conversa sobre o passado, presente e futuro da banda e este foi o resultado.

Música em DX (MDX) – Uma das primeiras entrevistas do Música em DX foi há dois anos com o David [Santos], e uma das perguntas feitas na altura para ele foi como é que conseguiam compatibilizar o You Can’t Win Charlie Brown com os vossos projectos em paralelo. Agora faço a mesma pergunta para vocês. 

Afonso Cabral: Para já, é com muita organização. Muito trabalhinho a ter cuidado com os nossos calendários. Ter cuidado de saber marcar as coisas que nós temos. Saber sempre com antecedência quem pode ir e quem não pode ir. Desde para aí um ano que em certos casos usamos pessoas – usamos pessoas soa ridículo – usamos substitutos.

Tomás Franco de Sousa: Sim, muitas vezes acontecia ao David não poder fazer um concerto, e isso estava a acontecer cada vez mais. O David também está a tocar imenso, e tivemos de arranjar substituto até ao regresso.

Afonso: Temos sempre quem possa preencher as nossas vagas.

MDX – Com o lançamento do vosso álbum [Marrow] ao ano passado e com algum distanciamento, qual é a análise que vocês fazem, o feedback… Que avaliação vocês fazem do próprio trabalho?

Afonso: Distância… Acho que ainda não temos. Ainda é um bocado estranho, mas só vamos conseguir ter alguma distância quando fizermos o próximo. Estamos no processo de promover e tocar. Os nossos concertos ainda são muito focados no Marrow, portanto para nós é uma coisa que ainda está muito a acontecer. Está muito recente. Mas a avaliação que podemos fazer até agora é positiva. Acho que as reacções foram positivas, parte da imprensa e das pessoas que gostam de nos ouvir, os concertos têm corrido bem… Melhor do que qualquer outro disco. Agora também no verão a coisa parece estar a correr bem, porque também vamos ao Paredes de Coura, vamos ao NOS Alive, vamos a outros…

MDX – E que análise acabam por fazer ao longo destes três discos? Qual é a vossa análise racional?

Afonso: Acho que tem sido uma evolução, primeiro. O que é bom. Mas acho que passo a passo e com tempo. Como deve ser, porque nós sempre dedicámos metade da nossa vida a uma vida normal, não que a vida de músico não seja normal, mas uma vida fora da música, e a outra metade à música que nós fazemos. Por isso tem sido uma evolução com calma, passo a passo, mas vemos a diferença. Desde quando lançámos o Chromatic, mal o lançámos fomos ao Paredes de Coura abrir o palco secundário. Para nós foi uma cena incrível. Tinha umas 200 pessoas, o suficiente para ser incrível. Agora voltamos a Paredes de Coura mas para o palco principal. Então acho que é uma boa maneira de percebermos a evolução.

MDX – E musicalmente sentes diferenças claras? 

Tomás: Do primeiro para o segundo já sentia. Do segundo para o terceiro sinto ainda mais. E não é necessariamente uma evolução de qualidade, mas se calhar a nível de som e de produção. Sentes isso. Mas a nível musical sim, sentes diferenças, mas não é necessariamente de qualidade. É diferente. E somos nós também que forçamos a fazer diferente.

MDX – Também fazem uma avaliação para pequenos detalhes.

Afonso: E não nos faz sentido também muito encaixotados. Fizemos o primeiro disco, e éramos muito conotados com a cena folk e não sei quê. Então apeteceu-nos fazer uma outra coisa. Eu gosto de ser um pouco do contra. Quando me dizem que isto parece não sei o quê, o que até pode ser um elogio, eu: Ai é? Então, para a próxima vai ser metal! [risos]

MDX – Estavam agora a falar do Vodafone Paredes de Coura e da possibilidade de tocarem num grande palco. Qual foi o concerto que mais vos marcou, pela diferença? Não no sentido de ter sido o maior ou o melhor.

Afonso: Não sei. Há muitos momentos assim marcantes. Talvez dos mais marcantes foi o que demos no São Jorge, em 2012. Foi um concerto que demos numa altura que íamos ao South by Southwest e fizemos um croudfounding e quem nos ajudasse a pagar as viagens uma das coisas que dávamos em troca – demos várias coisas – mas uma das coisas era um concerto que demos no São Jorge e foi aventura. Toda a produção foi do nosso lado com o agente da altura, foi tudo feito por nós de raiz. E tivemos o São Jorge esgotado e havia um carinho especial.

Tomás: E por sermos nós a tratar de tudo, nós respondíamos aos mails todos de todas as doações que as pessoas faziam, respondíamos e eramos nós que iamos por as coisas aos correios.

Afonso: Foi se calhar o mais diferente. Mas depois houve muitos outros concertos marcantes.

Tomás: Quando lançámos o Chromatic fomos para a rua tocar… Também foi diferente e especial. Estávamos ali nós e as pessoas se iam juntando à nossa volta e foi muito giro. Depois tivemos as cenas do primavera, que é uma cena de dimensão maior e diferente do que estamos habituados. Há vários.

Afonso: Temos os concertos do CCB e do LUX, que de formas diferentes, foram lançamentos de discos e foram marcantes. O lançamento do Velvet Underground que foi especial. Fizemos uma temporada no Musicbox em que estivemos três dias em que fomos tocando todos os nossos discos. Tocámos pouquíssimo tempo no último porque a luz se foi abaixo. E montes montes deles.

MDX – Vocês procuram então ter conceitos diferentes para situações diferentes. Uma maneira de dar originalidade à situação. 

Afonso: Mas isso tens de estar sempre um bocado atento às condições que tens. Do ambiente. Tens de saber adaptar um pouco ao que se passa. E também somos influenciados.

MDX – E agora mudando totalmente de tema. Têm um álbum ou música, não necessariamente recente, que vocês tenham pensado: “Gostava que tivesse sido nós a fazê-la?”

Tomás: [risos] Isso é muito complicado. Quando tu ouves uma música de outra pessoa, não sei, se for um cantautor é fácil responder, mas como uma banda não sei. É complicado porque cada um quer ter a sua identidade. E nós queremos ter a nossa identidade. É complicado ouvir e pensar que devíamos ter sido nós a fazer esta música, e sairia algo completamente diferente.

Afonso: Não sei. Estou a tentar lembrar de qualquer coisa. Mas não.

Tomás: Se calhar tu [a olhar para o Afonso] tens uma que gostavas de dizer que adoravas ter escrito essa.

Afonso: Acho que nunca tive essa situação. Há cenas que penso: Este gajo é brilhante! E quem me dera ser tão brilhante como este gajo. Como um Chico Buarque… Mas nessa onda. Mas não na onda de quem me dera fazer isto. Isso nunca tive. Mas já tive cenas que… Não sou grande fã do James Blake, mas quando ouvi o primeiro disco dele, pensei que soava a um disco que um tipo fez sozinho no quarto com o computador, um microfone e um teclado midi, e um gajo faz um disco. E pensei: Epá, quem me dera ser tão esperto para fazer com pouca coisa, fazer uma tão boa.

MDX – Uma coisa que já fizeram foram as tours lá fora. A tocar em Inglaterra, por exemplo. Que diferença é que notam entre tocar cá e lá?

Afonso: Não tem nada a ver. Quando fomos tocar a Inglaterra, foi um bocado ao voltar aos primórdios, quando começámos a tocar cá.

Tomás: Fomos tocar a bares e houve um caso que fomos tocar a um festival, que era um festival enorme, do tipo South by Southwest, mas em Brighton, que se chama The Great Escape. Aí tens bares e vários espaços da cidade de Brighton, que abrem para concertos. Esse foi o caso excepcional de Inglaterra.

Afonso: Foram bares e bares e andarmos de metro e autocarro sempre com o material atrás. Dormirmos em hostels e hóteis muito manhosos. Podes ir tocar para três pessoas que eram a banda que tocavam a seguir como para uma sala cheia.

Tomás: A cena do The Great Escape, por acaso, tocámos para três pessoas numa noite, e na noite do The Great Escape tocámos e tivemos tivemos um artigo na imprensa inglesa que foi uma cena muito uau.

Afonso: Mas quando à diferença, não há assim grande diferença.

Tomás: Toca-se mais cedo. [Risos]

Afonso: Há mais sítios onde há concertos a acontecer e as pessoas vão para lá. As pessoas vão para certos espaços por no bar “x” há aquela música e no bar “y” há outro.

MDX – E como foi, para comparar, a experiência do South by Southwest?

Afonso: Pá, deu para aprender. Aquilo é uma feira, e acho que foi uma grande aprendizagem para todo o trabalho de preparação e que tivemos de fazer cá.

Tomás: Sim, toda aquela angariação de fundos.

Afonso: E foi visivelmente bom para nós cá em Portugal. Deu-nos uma genica completamente diferente e mesmo lá demos dois concertos em três dias. É pouco tempo e no meio de milhares de bandas tens de te destacar.

MDX – Abriu algum tipo de portas, nem que seja cá dentro?

Afonso: Cá dentro sim.

Tomás: Sem dúvida que sim.

Afonso: Lá fora, um pouco. Mas precisávamos de estar lá muito. E isso requeria um investimento que nós não tínhamos capacidade.

MDX – Nem muito financeiro mas também emocional. 

Tomás: Tens de ter gente lá.

Afonso: E isso se aplica a Inglaterra também. Quando nós lá fomos, eu sinto que a coisa correu bem. Eu lembro-me de estar na primeira página do MySpace e era o Snoop Dogg e nós. [risos] O que era muito estranho. Mas se não estás lá de dois em dois meses, e como tens emprego, família… Se tivéssemos todos 20 anos e 18, e espírito aberto, se calhar arriscávamos e era mais fácil.

MDX – E pegar num tema mais actual. Como é que vocês têm a dizer deste efeito “Sobral” por cá?

Tomás: Eu acho que foi uma grande vitória para a música portuguesa.

Afonso: Principalmente uma grande vitória para eles, para o Salvador e para a Luísa e para o pessoal que trabalhou com eles. Eu pessoalmente acho a música muito bonita, e ainda bem que bem ganhámos.

MDX – E a nova fórmula do Festival da Canção resultou. Foi um efeito “Antena 3” para o festival, que até o próprio David colaborou. Houve esse tipo de mudança e visão.

Tomás: Houve completamente.

Afonso: E ganhámos o Eurovisão. Eu não via o Eurovisão há algum tempo. O Festival da Canção então… mesmo ainda. E vi as duas meias finais do Festival da Canção, aliás, fomos lá à RTP ver. E foi naquela: metade dos concorrentes são meus amigos que estão ou nas bandas a tocar ou escreveram as canções e é estranho.

MDX – E para terminar, o que andam a fazer até chegar os festivais de Verão?

Afonso: Estamos a escrever canções para ganhar o próximo Eurovisão. [risos] Não, agora estamos agora a ensaiar novas coisas e outros projectos.

Entrevista – Carlos Sousa Vieira
Fotografia – Nuno Cruz