Ao segundo dia o Super Bock Super Rock vestiu-se de forma diferente: as t-shirts de bandas de rock permaneceram em casa, os estilos eram mais contemporâneos. O público mostrava-se também ele díspar. Se estávamos habituados a que a generalidade dos festivais de verão fossem um espaço que apenas respondia e representava os gostos e ânsias de uma população caucasiana, de classe média-alta, pertencente a uma determinada faixa etária, esta tendência tem se alterado nos mais recentes anos. O SBSR tem oferecido um importante contributo nesta matéria, e este dia é um bom exemplo disso mesmo.
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Hoje era a vez da cultura Hip-Hop. O dia encetou com o Pusha T, e face à extensa e sólida popularidade do Rapper Americano, estamos ainda todos para perceber a lógica de ter atuado às 17 horas.
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Em boa verdade, nem nos seus melhores sonhos Keso – que se apresentou no palco LG – actuaria num festival depois daquele músico Americano. Com um recurso lírico assinalável, Marco Ferreiro distribuiu intervenção, rimas, citações e ironias em dose considerável. O portuense debruçou-se sobre KSX2016, o seu último trabalho, conquistando o respeito daqueles que o assistiam. Justíssimo.
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De volta ao Palco EDP encontramos uma pequena população a aguardar um dos mais recentes fenómenos do Hip-Hop lusitano. Se Slow J protagonizou um dos bons concertos da edição passada, este ano a exigência – e o palco – era maior. Se entrar em palco a assumir uma cover do Pai do Rock Português é sinal de ousadia, cantar que quer “fazer com o Rui Veloso aquilo que o Ronaldo fez com o Figo” é uma provocação só ao alcance daqueles que nunca fazem “pazes com essa estagnação”. Ainda o público batia palmas e já nos era atirado outro cover. Menina Estás à Janela, de Vitorino, foi a prova que João está-se bem a borrifar para o establishment e pré-conceitos: não seria suposto um rapper principiar um concerto com duas versões, especialmente quando uma delas é de uma música tradicional alentejana. Tão bonita como esta determinação de devastar bafientas fórmulas e cânones só o solo de piano que o acompanhou nesta interpretação.
Com uma considerável noção de palco e comunicação, o gig teve o seu auge lírico em Comida, o tema mais conseguido do The Art Of Slowing Down, o seu álbum de estreia. Apesar da sua audácia, Slow J mostrou abundante humildade ao interpretar parte de Canal 115 de Valete. Cresci a ouvir as músicas dele, afirma. Se os bairros desfavorecidos e as pessoas marginalizadas encontraram em Valete a sua voz, Slow J, ao abordar matérias contemporâneas e quotidianas, poderá ser o representante de uma geração fodida pelos sonhos que não lhes deixaram alcançar, que trabalha apenas para pagar as suas contas e que muitas vezes se vê arrastada para longe por um mercado de arrendamento feroz. Para as derradeiras músicas o Rapper foi coadjuvado em palco, dando a Pagar as Contas e Vida Boa uma roupagem mais festivaleira. O público aceitou a proposta e ninguém saiu ileso. Nem o Hip-Hop Nacional. Ou será Hip-Rock? Não nos preocupamos, “vai correr tudo bem”.
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Antes do aguardo concerto de Akua Naru, dividimo-nos entre o Palco Super Bock e o Palco LG. A dupla Octa Push estava rodeada por uma multidão de curiosos. Se Push, Push foi o tema mais identificado, o prémio de música mais dançada teria de ser entregue a Gaia Cósmica, interpretada com a subida a palco dos Cachupa Psicadélica.
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No Meo Arena estavam os Alcobacenses The Gift. Se vertermos num receptáculo os seguintes ingredientes: um, palco desproporcional à banda; dois, apresentação de músicas ainda pouco conhecidas do novo álbum; e três, uma sonoridade que pouco tem que ver com aquele dia, o resultado final nunca poderá ser satisfatório. Tecnicamente pouquíssimo haverá a apontar à banda, que ofereceu um espectáculo competente, mas face às circunstancias nem toda a experiência e suor de Sónia Tavares fizeram milagres.
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Akua Naru, Akua Naru, Akua Naru. Foram as palavras mais repetidas depois do recital de Hip-Hop com toques refinados de Jazz. Dificilmente alguém permaneceu indiferente à cantora que entrou em palco inteiramente de negro, e que abordou os espectadores olhos nos olhos. Passando de forma equitativa pelos seus anteriores trabalhos, foi Poety: How Does It Feel o momento que mais arrepios proporcionou. O melhor exemplo que encontramos será How does it feel to make love to your soulmate, entoada a trote de uma sensualidade pouco vista neste estilo musical. A Rapper poderia facilmente escrever um livro sobre o que pode uma mulher fazer no, e pelo, Hip-Hop. Revelando-se uma fértil comunicadora, afirmou que “a música tem mais peso que qualquer pessoa ou país”, e que este não seria apenas mais um concerto. E não foi, mas tens muito que agradecer à tua banda, Akua.
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No Palco Principal eram aguardos os britânicos London Gramar e o seu Trip-Hop ambiental. Com um cenário minimalista, uma versão desportiva de Hannah Reid transportou-nos para o seu mundo através de temas como Hey Now ou Truth is a Beautiful Thing. O público respondia positivamente à impecável amplitude vocal de Reid e a uma musicalidade que não fazia pendant com o segundo dia do festival. O tema Strong foi a última escolha da banda para encerrar um concerto antes de abandonarem o palco com um: “Obrigado, vocês foram fantásticos”, dito pela vocalista, que recebia aplausos por um concerto conseguido, mas que não entusiasmou a plateia de forma transversal. Era caso para perguntar: foi tão razoável para ti como foi para mim?
Ninguém sabia muito bem o que esperar de Língua Franca. O grupo formado pelos brasileiros Rael, Emicida, e pelos portugueses Capicua e Valete, apresentava o seu disco no SBSR, e para os receber víamos uma multidão de fãs ansiosos. É certo que a atuação foi a largos espaços apenas a soma das partes: Capicua a interpretar sozinha em palco Vayorken e Maria Capaz, o mesmo com Valete e o seu Rap Consciente – com Slow J a #dartudo no meio do público. Vários momentos em que permaneciam em palco apenas os Rapper Brasileiros levaram-nos a questionar que resultado daria aquela equação. No entanto, se isso poderia parecer um handicap, a realidade é que o público manteve-se interessado e interactivo do primeiro ao último momento. As mensagens foram certeiras e a presença de Valete – um verdadeiro iconoclasta – orientou as retinas naquele palco. Depois de afirmarem que “tudo começa com a porra de um sonho”, atiram-se à incrível Ela, sendo perceptível um genuína felicidade no quarteto lusófono. Saímos dali de barriga cheia, mas em breve veremos de que material é feito os pés deste gigante.
O entusiasmo com Future era generalizado, e queríamos muito perceber se o hype era justificável. Temos ouvido imenso nas última semanas, mas não tinha entrado. Não foi por falta de insistência, acreditem. Talvez ao vivo perceberemos a cena deles, pensamos. O Meo Arena estava uma sombra do dia anterior, e o som ainda pior. Apesar de nas bancadas nem sempre serem perceptíveis as letras das musicas, distinguimos temas como Super Trapper ou Jumpman, em que a plateia se dividia entre entusiasmo e amiúdes conversas. O auto-tune foi uma presença constante, poderá parecer estranho mas oferece um tom interessante aos momentos em que conseguimos distinguir a voz de Nayvadius. O concerto terminou com Mask Off e não houve direito a encore: uns quase choravam, outros agradeceram.
Dizem-nos que o Trap é o novo Rock, mas não acreditamos. O mundo vai-se alterando de forma veloz, e se realmente for este o futuro que nos espera ficaremos para sempre num presente onde Slow J marca um lento mas coerente compasso.
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Texto – Tiago Pinho
Fotografia – Luis Sousa | Vera Marmelo (Língua Franca)
Evento – Super Bock Super Rock 2017
Promotor – Música no Coração