Apesar da ‘ressaca’ do Super Bock Super Rock ainda estar bem presente na nossa mente, outro dos grandes festivais de Verão a acontecer em Julho já arrancou: o EDPCoolJazz. Com a 14ª edição do festival que reúne o melhor das sonoridades do jazz, soul, funk e blues a tomar de invasão a vila de Oeiras, o primeiro dia do evento arrancou no passado dia 18 de Julho ao som da portuguesa Márcia e da dupla mexicana Rodrigo y Gabriela, o nome forte do dia.
Numa estranha noite de Julho, onde as nuvens cobriam o céu de uma ponta à outra e onde uma brisa tipicamente primaveril convidava a que nenhum casaco ficasse pendurado em casa, a afluência pelos Jardins do Marquês de Pombal era um pouco reduzida tendo em conta a proximidade da hora que marcava o concerto inaugural. Para aqueles que já pernoitavam por lá, muitos eram os que punham a conversa em dia enquanto saboreavam alguns dos pratos gourmet ou a extensa variedade de vinhos que o festival oferecia.
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Quando o palco ficou disponível para que o público ocupasse os seus lugares, muitos foram aqueles que permaneceram em ‘modo jantar’ e deram continuidade às suas conversas, com apenas as primeiras cinco filas da frente a ficarem totalmente ocupadas. Todavia, quando Márcia entrou em palco, o recinto lá que se foi compondo para aplaudir o regresso da artista a um festival onde foi tão feliz em 2014.
Num dia destinado aos ritmos alucinantes e frenéticos de Rodrigo e Gabriela, a ternura que se solta nas palavras de Márcia e a doçura impulsionada nas notas da sua guitarra poderiam, à primeira vista, soar como algo de desfalcado e desenquadrado, mas estamos perante uma artista que sabe contornar este tipo de situações adversas, sempre triunfando por cima.
“Quem me conhece em concertos, sabe que sou imenso tagarela, mas hoje estou muito mais contida por questões de tempo”
, gracejava perto do final do concerto, arrancando umas quantas risadas de uma plateia que se demonstrava demasiado tímida face àquilo que era habitual nos concertos de Márcia. Desde cedo, a artista tentou romper a fronteira entre si e o público, mas este revelava-se demasiado tímido para ceder às ‘provocações’ e aos desafios em participar nas suas canções.
Privilegiada por um stage time a rondar os cinquenta minutos de duração, Márcia percorreu um pouco por todo o seu reportório que já alberga três discos de originais, embora, como se previa, foi o último, Quarto Crescente, que recebeu a maior ênfase. No seu mais recente álbum, a evolução e o crescimento da artista são notórios, remetendo-nos para a ‘menina’ que subiu àquele mesmo palco em 2014 e regressou agora, como uma mulher feita que hipnotiza qualquer um com temas tão belos como “A Pele Que Há Em Mim”.
Perto do fim, onde incentiva a que o público se junte a si pois, “no próximo concerto, aviso desde já que eles não cantam, por isso é melhor aproveitarem agora”, houve ainda tempo para uma lembrança da última vez que tocou pelo festival de Oeiras, com uma muito aplaudida versão de “Luka” de Suzanne Veja, a mesma artista para quem abriu naquele ano e, tal como fora antes, Márcia voltou a ser feliz no EDPCoolJazz.
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Sem as habituais bancas de brindes típicas de um festival de Verão, e já com a hora de jantar bem longínqua, a ânsia e o desejo pelo próximo concerto era grande e, felizmente, não foi preciso esperar muito para que Rodrigo Y Gabriela subissem a palco… pelo menos Rodrigo Sanchez, visto que a sua compatriota Gabriela Quintero teve que ser (literalmente) carregada para o palco.
Motivo? Partiu recentemente o pé. Apesar da lesão algo preocupante da guitarrista, esta não se deixou abalar pela mesma, munindo-se de um gesso na perna esquerda e fazendo de uma simples cadeira de rodas, o trono desta rainha flamenca. Face à situação débil de metade da dupla, alguns detalhes técnicos como um simples soundchek são impossibilitados, o que levou a que o início do concerto sofresse de alguns problemas de som, com a guitarra de Gabriela a soar demasiado abafada face à do seu companheiro, que começava a demonstrar vestígios de irritação face ao sucedido.
Naquela que seria a última noite da tournée europeia de Rodrigo Y Gabriela, os constantes problemas de som pareciam estar lentamente a condenar a atuação, mas, após umas pausas necessárias para contornar o problema, acompanhadas por pedidos de desculpa por parte de ambos os membros da dupla, a situação lá que encontrou solução e foi a partir daí que o concerto entrou a todo o gás.
Talvez em jeito de ‘compensação’ pelo sucedido, Rodrigo Y Gabriela decidiram dar (ainda) mais pujança à sua atuação que, só por si, têm o hábito de ser alucinantemente frenéticas, provocando um autêntico vendaval de notas de guitarras a serem disparadas em todas as direções. Apesar de um vendaval estar intrinsecamente ligado a confusão, a única parecença com o caos que a dupla mexicana pode eventualmente causar no público é a incógnita de como saber repartir a nossa atenção em Rodrigo ou em Gabriela.
O ex-casal tem a rara característica de saber funcionar num todo, com ambas as partes a desempenhar um papel fulcral na sonoridade por trás deste projeto que concilia tanto folk e jazz com uma pitada bem condimentada de flamengo vibrante, que prende qualquer um à sua cadeira. Apesar do frio que pairava pelo recinto, o ritmo ‘caliente’ vindo do palco cativa qualquer um, com os fãs mais expressivos a marcarem o compasso de temas como “Tamacun” “Hanuman” através de palmas bem pontuadas; tudo isto enquanto os mais impressionáveis ficavam de queixo caído com o que se passava em palco.
Rodrigo y Gabriela sempre tiveram a capacidade de conseguirem contornar as impossibilidades que muito condicionavam aquilo que duas simples guitarras conseguiam fazer: Gabriela faz a sua guitarra soar um jambé, responsabilizando-se pela percussão da dupla de forma irrepreensível, quando não desliza os seus dedos pela arte do dedilhado na qual é mestre; já Rodrigo, assume a personalidade de um sedutor ‘macho latino’ ao manusear a sua guitarra como se de uma parceira de o tango se tratasse, fazendo-a soltar sons tão distorcidos que nos remetem mesmo para bandas psicadélicas. Com base em todas as facetas que a dupla prova que duas guitarras conseguem (afinal) fazer, até nos custa a acreditar que estão apenas duas pessoas em palco, dois músicos que fazem uma arte que dificilmente conseguiria ser alcançada por um número inferior a seis.
Por ser o final da sua tournée europeia antes de umas férias bem merecidas – as melhoras, Gabriela! – houve tempo para mostrar temas do futuro próximo álbum da dupla, prevendo-se grandioso como tão bem nos habituaram ao longo dos anos. Grandiosa acabou por ser a primeira noite da 14ª edição do EDP CoolJazz, com dois concertos a encher as medidas de qualquer um e a deixar-nos sedentos por muito mais que, felizmente, terá continuidade continuidade até ao final do mês. Contudo, avisamos já: depois deste primeiro dia, a fasquia para os restantes dias ficou bem elevada.
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EDPCoolJazz’17, Dia 18 – As Variadas Facetas que uma Guitarra pode ter
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Texto – Nuno Fernandes
Fotografia – Luis Andrade
Evento – EDPCoolJazz’17
Promotor – Live Experiences
