A rua é a da Barroca, em pleno Bairro Alto. O número é o 59. Foi na Galeria Zé dos Bois que Colleen, nome artístico para Cécile Schott, apresentou o seu sétimo disco de originais A Flame My Love, a Frequency. A multi-instrumentista francesa escolheu Portugal para o arranque da sua digressão europeia, no passado dia 7 de Dezembro.
Pouco passava das 22h, quando um suave good evening captou a atenção do público que levou a sala aquário da Galeria ZDB a arrebentar pelas costuras.
Colleen entrou para testar e retificar a sua mesa de som, e tudo indicara que o concerto começaria dentro de instantes. Foi precisamente às 22h12 que os primeiros sons electrónicos de “November” se fizeram ouvir. Este A Flame My Love, a Frequency assume-se como o disco mais conceptual de Colleen e o primeiro disco totalmente electrónico. Para trás deixou a viola de gamba, a cítara, o clarinete e até mesmo o espanta espíritos.
Ao longo do concerto tocou o disco na íntegra, e respeitou a ordem pelo qual os oito temas foram apresentados ao mundo no passado mês de Outubro pela Thrill Jockey. Prosseguiu com “Separating”, onde introduziu a voz. Aquela que até há uns anos tinha receio de mostrar. Schott concentrou-se nos seus dois pedais moog, no sintetizador septavox Critter & Guitari e nos esquemas electrónicos em papel correspondentes a cada música. Mete cabo, tira cabo. Pega esquema, vira esquema.
Pausa! Vem aí “Winter Dawn”. 30 segundos bastaram para Colleen parar de tocar e assumir de forma honesta o cansaço. Comunica com o público a dificuldade em tentar perceber a correcta dinâmica da música. Com aplausos, lá recomeça.
A “Winter Dawn” é provavelmente a letra mais castigada deste disco “the world had nearly ended yet the sky was blue and i came home with a fistful of fear”, canta Colleen com um pouco de delay na voz. O medo da doença e da morte é o mote para este disco que tem tanto de peso como de leveza. Apesar de estar a viver em Espanha há alguns anos, Collen estava em Paris no dia dos atentados em Novembro de 2015. Este disco é a consciencialização de que a morte e a vida podem perfeitamente andar de mãos dadas. A exploração dos seus diversos estados interiores continua com “The Stars VS Creatures” e em “One Warm Spark”. Após uma hora de concerto intimista e de ambiente musical minimalista, Colleen apresenta a última música do alinhamento, mas promete um encore para quem estiver interessado.
A Colleen é assim. Simples. Aliás, é de realçar o macacão azul com que se apresentou em palco. É a própria que costura a sua roupa, quer por razões éticas, de anti – consumismo ou de valorização do empreendorismo através da aprendizagem. Toda a digressão deste disco foi feita com roupa costurada pela própria, e em Lisboa não foi diferente.
Quase na recta final do concerto, Colleen termina com “The Night of the Hunter”, uma versão de um filme de Charles Laughtons de 1955 com o mesmo nome. Por último, final feliz para “Summer Night (Bat Song)” onde faz referência aos bons momentos passados em casa dos pais, no verão.
Agradece ao público, elogia o técnico de som e felicita a Galeria Zé dos Bois que, pela quarta vez, tão bem a recebeu.
No páteo da Galeria ZDB as opiniões dividem-se. Diante de um emaranhado de botões, de fios e de algumas pausas entre as músicas, o que ficou?
O belo e o feio. Frequências cortadas. O delay e um pouco de feedback. A felicidade e a tristeza juntas.
Reflexão.
Texto – Raquel Nunes Silva
Fotografia – João Rebelo