Quando um grupo de músicos se decide juntar para criar música, surge sempre o nervoso miudinho do receio do resultado que daí advém. Um receio bom, coberto de expectativa e desejo. Quando esse grupo decide lançar o primeiro álbum e o resultado se mostra tão grandioso e tão vestido de camadas e camadas de brutalidade qualitativa como o Ultrabomb, o nervoso miudinho regressa, e o receio de que o seu sucessor não consiga ser tão bom emerge. Mas não estou a falar de um grupo qualquer! Falo dos The Quartet of Woah! e da personalidade musical vincada que cada elemento tem. Foi ela que esteve na génese da criação deste segundo trabalho, Homónimo, extremamente completo e complexo que coloca a descoberto cada um enquanto indivíduo e o todo da banda.
“É difícil dizer! acho que nos superamos por gostarmos de experimentar e não termos medo de entrar em caminhos esquisitos se repararmos que é isso que nos faz o coração bater mais depressa! Tens que sentir isso e usa-lo como o teu mapa, e o resto vai atrás.”
Este álbum, não só tem vida e personalidade próprias e vincadas como, também, representa caminhos densos e extensos de alquimias mentais onde a construção tem como base a desconstrução de tudo e de todos. Um grito a uma voz ensurdecedora que fica a ecoar na cabeça e no peito!
“As quatro faixas surgem pela mesma razão que é homónimo. Porque somos nós!”
São 4 as faixas que o compõem! 4 longas faixas que em tempo algum nos deixam sentimentos de canseira, mas, ao invés, de sede de mais e uma vontade súbita de nos embrenharmos em tudo o que absorvemos de tal maneira a que, tal como o resultado destas faixas, nos tornemos num todo invencível.
“Pode dizer-se que seguimos um exercício em que isso estava disponível, se querias ou não falar da tua alma, ou do que é que querias realmente falar. Quisemos dar voz a cada uma das personagens e pôr o quarteto a elogiá-las.”
A verdade é que cada faixa tem uma personalidade forte! Cada alma, ali exposta, acolhe em si chamamentos ancestrais e cria ilusões intrigantes que nos fazem duvidar de nós próprios. Há uma variedade de ritmos e construções calculadamente geniais e inatas em si mesmas. O manto negro que abraça este álbum desconstrói-se na compressão harmónica que resulta de uma comunhão quase inexplicável de todos os elementos existentes. O resultado sonoro quase que nos faz explodir por dentro por nos faltar, por vezes, a capacidade de absorver tamanha intensidade. Intensidade essa que se desmembra em arrepios, faltas de ar e uma completude enorme de satisfação. Tudo em nós estremece e tudo parece um todo!
Poderia descrever este álbum como uma missa onde estamos todos lado a lado, cobertos de hoodies negros, de rosto para baixo, a ser absorvidos por uma espécie de néctar que vai subindo pelos pés e, quando chega à cabeça, nos faz explodir em migalhas de prazer e levitar dentro de uma bolha onde não vemos o contorno, só o escuro. E aí, tocamos no infinito sem perceber bem o sentido das coisas. Uma espécie de nirvana transcendental acompanhado por sons miraculosamente cuidados com o objectivo de sentirmos um transtorno que não percebemos bem se vem de nós ou daquelas 4 almas.
Em “As In Life” a densidade transforma-se num rodopio de sentimentos a gritar em forma de grandeza musical que nos acelera a circulação sanguínea e nos cria sentimentos sôfregos de prazer extasiante. Há uma eterna procura por uma saída e há o receio do que ela pode trazer. “Forth By Light” é, talvez, uma das malhas mais perturbadoras do álbum. Perturbadoras porque nos cria um exasperante arrepio que nos sufoca dentro de uma intensidade abstracta de razão que temos medo de conhecer. Há uma força sobrenatural que vem da luz. Uma luz interior que teimamos em ofuscar. Em “A Flock Of Leaves” somos defrontados com uma consciência superior que vem da voz de Rui. A inquietação surge de imediato e faz-nos ser inundados por uma insanidade deliciosa que vai e vem numa montanha russa que mistura dinamite com uma limonada de framboesa e cria explosões epilépticas dentro de nós e nos faz acordar numa estrada banhada pela luz da lua, coberta de árvores e arbustos onde o único medo que existe é o de nos tirarem dali. Passamos por vários estágios de sentidos e emoções e chegamos a conversar com índios. Por fim, há um certo cheiro a anos 90 com um manto de qualidade em “Days Of Wrath”. De súbito vemo-nos a atravessar o sol californiano de sorriso estampado no rosto. Há uma harmonia alegre que nos envolve em esperança e nos faz sentir livres! Uma aceleração boa empurra-nos para um conjunto de ritmo e cor, terminando da melhor maneira a viagem que fizemos sobre as asas do pato!
Ao longo da viagem encontrámos vozes loucas, penetrantes e hipnotizantes. Coros divinais e cobertos de uma leveza densa aprimorada. Uma primazia do baixo e de todo o seu conforto e umas teclas mágicas que fazem tremer o chão! Cruzamo-nos, também, com riffs que beberam em Zeppelin, Pink Floyd e até, Guns’n’Roses.
Depois de serem revelados os tops de 2017, custa-me, sinceramente, perceber como é que este Homónimo não é o álbum do ano!
“Vão poder ouvir essas quatro faixas, em espectáculos únicos e exclusivos, a anunciar brevemente.”
Os The Quartet of Woah! vão fazê-lo no próximo dia 25, no RCA Club.
Mais info aqui.
Texto – Eliana Berto
Respostas – The Quartet Of Woah!