A Glenn Miller Orchestra, dirigida atualmente pelo maestro Ray McVay, regressou a Portugal para três concertos – em Faro, Porto e Lisboa – e demonstrou mais uma vez que se trata de um fenómeno de sucesso por cá. No Centro Cultural de Belém (CCB) o grande auditório não esgotou, mas foi por pouco. Quem lá esteve, pôde deliciar-se com aquela que era a música popular nos anos trinta e quarenta do século passado.
Formada em 1937 por Glenn Miller, que já havia formado uma outra banda no ano anterior, acabando por rapidamente a dissolver já que a considerava muito parecida com o que já se fazia naquela época, a Glenn Miller Orchestra foi criada em torno de um clarinete e de um saxofone tenor melódicos, tornando-se bastante popular e gravando vários sucessos como “Moolight Serenade”, “In the Mood”, “Little Brown Jug”, “Chattanooga Choo Choo”, “A String of Pearls” ou “(I’ve Got a Gal in) Kalamazoo”. Glenn Miller veio depois a falecer em 1944, durante a Segunda Guerra Mundial, e a partir do seu desaparecimento a banda foi reconstituída sob a direção de Tex Beneke. Anos mais tarde, a família de Miller veio a substituir Beneke por Ray McKinley. A Glenn Miller Orchestra continuou até hoje a gravar e a apresentar-se ao vivo com diferentes maestros, que foram mudando ao longo do tempo.
Na noite de domingo, dia 11, ocorreu então o regresso da banda americana ao CCB. Quando lá chegámos, deparámo-nos com uma fila enorme para entrar, o que deu de imediato a entender que seria mais um evento de sucesso da Glenn Miller Orchestra em território nacional. Para além do tamanho da fila, também se destacava a forma aprumada como a generalidade das pessoas estava arranjada para ir assistir a esta noite revivalista, mais parecendo que estávamos nos salões de baile algures nos anos trinta ou quarenta. A acrescentar à boa vestimenta, o público que marcava presença no auditório maior do CCB revelava também uma grande maturidade e conhecimento musical, tendo de certeza a perfeita noção do que iria ali passar-se.
Passava pouco das 21h quando os músicos que compõem a Glenn Miller Orchestra começaram a entrar em palco e a posicionar-se nos respetivos lugares. O maestro Ray McVay foi o último a entrar em cena. Reparou-se de imediato que também os músicos não deixaram o seu visual em mãos alheias, já que estavam vestidos com requinte e de forma idêntica, todos de casaco vermelho, com exceção de Ray McVay que se apresentou de casaco azul.
A orquestra era composta por um baterista, um contrabaixo, um pianista e uma enorme secção de metais. Para além dos músicos, tivemos também dois cantores que iam entrando e saindo do palco, conforme os seus dotes vocais lhes era solicitado em alguns dos temas. Uma parte dos membros da secção de metais também se dedicou por vezes à missão de cantar. No centro de todos eles, estava a bateria, conduzida por Denton Elkins, e tal não ocorreu por acaso, já que era ela que determinava muito do que se ia tocando. Ao longo do espetáculo, Ray McVay foi apresentando, um a um, cada um dos extraordinários músicos que compõem esta orquestra, como também introduzindo os temas que iam interpretando. Tal como acontecia com as grandes orquestras de jazz nos seus tempos áureos, também aqui tivemos aqueles momentos de humor tão caraterísticos dessas atuações, em que apesar de previsíveis não deixam de ajudar a criar a ideia de que aqueles músicos ainda vibram de facto com todo o universo glamoroso das décadas de tinta e quarenta do século vinte, em que esta era a música popular de então.
O concerto decorre de forma natural e sem falhas, sendo a rotina quebrada só em breves instantes, como aconteceu durante a interpretação de dois temas de Frank Sinatra – “My Way” e “New York, New York” –, em que o público acompanhou cantando e o técnico de som ensaiou uma tentativa de fazer com que as pessoas acendessem as lanternas dos seus telemóveis, o que não resultou, ou quando os músicos encarregues dos trombones decidiram sair do palco e dar uma volta pela plateia, tocando e abordando de uma forma simpática todos aqueles por quem iam passando.
No final ainda houve direito a um encore, “exigido” pelos presentes. Quem esteve no CCB, teve a possibilidade de durante uma hora e meia viajar no tempo até a uma época que já não volta mais, para o bem e para o mal. Acima de tudo, o que tivemos ali foi uma dose de qualidade de puro revivalismo e nostalgia de um tempo de glamour em que as grandes orquestras de jazz faziam a música mais ouvida de então.
Texto – João Catarino
Fotografia – Ana Pereira