Na passada terça-feira à noite o Musibox Lisboa, completamente lotado, recebeu os canadianos Metz. Dificilmente poderíamos pensar numa sala mais apropriada à efeméride. Estes canadianos que tem vindo a incendiar palcos lançaram no ano passado o terceiro álbum, Strange Peace, sucessor de Metz (2012) e II (2015), e este foi o primeiro concerto de uma tour europeia onde irão ter os californianos Moaning a aquecer a plateia. Ambas as bandas fazem parte, actualmente, do catálogo da icónica Sub-Pop, por onde passaram os Nirvana, Soundgarden ou os Mudhoney.
Apresentações feitas? Nem por isso. Tenho a acrescentar algo que achei no mínimo curioso mas não descabido. A produção de Strange Peace é de Steve Albini. Posto isto, e os relatos dos concertos incendiários dos Metz, não havia muito mais a fazer senão colocar este concerto na agenda como algo a não perder.
A noite de terça-feira terá sido uma das primeiras noites de primavera que tivemos hipótese de desfrutar. A noite amena convidava a sair de casa para beber café, conviver e o que mais se queira, por isso não era de estranhar que o Cais do Sodré estivesse tão animado.
O Musicbox encheu rapidamente, e por volta das 10:40 a casa encontrava-se já com uma lotação razoável e um a expectativa pairava no ar.
A entrada dos Moaning foi algo tímida, mas logo que o som da sala se estabeleceu ficou claro que apesar do ar de miúdos do trio californiano, sabem provocar à séria. Passado aquele choque inicial de expectativa gorada (aparentemente algum público esperava ter recebido unicamente os Metz) e depois de duas ou três músicas, banda e plateia já estavam no mesmo cumprimento de onda e os Moaning recolheram uma boa ovação na estreia europeia.
A pausa entre concertos serviu para também para alguns ajustamentos de som, ou talvez fosse mesmo o soundcheck dos Metz, que se mostraram em palco a tratar de tudo. O público reagiu efusivamente apesar de ainda não se tratar do concerto, algo que não tardou muito apesar daqueles minutos terem parecido muito mais longos do que realmente foram. Nesse breve espaço de tempo o espaço fisico disponivel diminui bastante e a plateia tornou-se muito mais compacta porque este público queria de facto estar perto, sentir cada batida e cada riff na cara e no corpo.
Assim que os Metz pisaram realmente o palco e as luzes diminuíram de intensidade sentiu-se o frenesim que percorria toda a gente, e os Metz souberam aumentar essa ansiedade começando com The Swimmer cuja entrada se assemelha a um rádio a pilhas, para que depois pudessem explodir com todo seu poder em Mess Of Wires onde a repetição dos riffs crus da guitarra Alex Edkins, o baixo poderosamente distorcido de Chris Slorach em conjunto com a bateria corpulenta de Hayden Menzies, se tornam quase uma obsessão. Quando Edkins anuncia Gett Off, foi como se tivesse dado o tiro de partida para um mosh pit que abarcava quase toda a primeira parte da sala, numa explosão de suor e adrenalina completamente inebriante, tal a energia juvenil que dali emanava. A energia possante dos Metz é sem dúvida incontornável e contagiante.
Menzies espanca literalmente a bateria, e cada toque dele é como um murro no estomâgo. Slorach por seu turno sova o baixo e arranca dele um som distorcido e abrasivo que nos esbofeteia. Edkins dá o mote para Eraser e além de mosh pit vigoroso podemos ver uma vasta quantidade de gente num vigoroso headbanging. Os decibeis em niveis deliciosamente perigosos como se quer nisto, mutilam o corpo e a carne mas ninguém quer abrandar. Edkins mostra claramente que é este o objectivo e os canadianos não abrandam, pelo contrário; Drained Lake com a sua batida rápida e corpulenta mantém-nos num nivél de agressão disruptiva; “I heard the voice within my head I heard it hanging it in the air I won’t do what you want I won’t do what you want I won’t do what you want” gritam sob um mar de distorção. O que o trio quer é levar o público ao limite, como se estivessem a testar-nos, não abrandam, não diminuem o nivél de decibeis e fazem-nos sempre pensar se o que se segue supera o que já vimos. De música em música superam-se e obrigam o público a superar-se a si mesmo; Nervous System, Headache e Raw Materials. Intensos, precisos e completamente alinhados entre si os Metz pertencem aquela categoria especial de bandas que só faz discos porque faz, porque os Metz são verdadeiros animais de palco e o que fazem mesmo bem são os concertos onde se entregam até à ultima gota de suor que pareciam que iam dar com Cellophane.
Curiosa e aparentemente apesar do concerto ser curto parecia mesmo ter terminado, mas Lisboa queria mais e após a insistência do público houve ainda tempo para mais duas músicas de destruição, emoção, corpos pelo ar, gente bastante crescida a mergulhar do palco para a multidão e o próprio Alex Edkins a comungar desse mesmo prazer.
Transgressores de qualquer limite, parecem nem conhecer o significado disso para eles próprios, insubmissos e obsessivos os Metz dão tudo em palco, exploram cada distorção ao máximo, golpeando todo o espaço com o seu som, tornando a sala um inferno insuportável de emoção bruta. Assim e tendo o público que tiveram é normal que o desenlace tenha sido exactamente um momento de explosão de adrenalina fantástico e possivelmente irrepetível.
Texto – Isabel Maria
Fotografia – Ana Viotti | Musicbox Lisboa