David Bowie defendia-a enquanto “o futuro da música”; David Grohl considera-a como “uma réstia de esperança dentro do universo pop”. Em 2013, quando lançou o estreante Pure Heroine, a neozelandesa Ella Yelich-O’Connor, mais conhecida como Lorde, veio revolucionar a música pop com a honestidade presente na sua abordagem sombria e eletrizante.
Para além da audácia na sua sonoridade, a (aí) adolescente também impressionava na componente lírica das suas canções, com uma escrita deveras madura para alguém de tão tenra, abordando assuntos de teor juvenil, como questão de existencialismo, capazes de suscitar a reflexões bem ponderadas através das mensagens de cada canção. Com apenas um disco, Lorde tornou-se numa das artistas mais badaladas da sua geração, assim como detentora de um dos maiores índices de potencial que a pop da nova década acolhera.
Para além dos elogios pela forma como Lorde conseguiu produzir um disco de estreia em que todas as canções conseguissem ter o mesmo impacto de que os popularizados singles, sem entraves pelo meio, a crítica salientou também como é que uma jovem, outrora desconhecida, ousou desafia e revolucionar os estandartes da pop actual, com o seu minimalismo a prevalecer por entre uma cultura genérica e repetitiva. No meio de dezenas de fotocópias musicais, Lorde autoproclamou-se como uma ‘freak’ e mostrou o quão saudável é ser-se diferente.
Rapidamente, o mundo apaixonou-se pela pequena Ella e o papel enquanto artista de culto assentou-lhe que nem uma luva, com “Royals” a tornar-se num dos maiores hits de 2014 e que chegaria mesmo a ser consagrado com o Grammy de ‘Melhor Canção’ nesse mesmo ano. Numa questão de meses, a carreira de Lorde catapultou, ficando a certeza que o seu futuro seria risonho.
Foi em meados de 2017 que Lorde voltou a cair debaixo dos nossos radares quando, depois de uma pausa de quase três anos, vestígios que a artista estaria de regresso aos discos começaram a aparecer. “Green Light”, single de avanço para Melodrama, marcou o regresso de Lorde, agora adulta, às luzes da ribalta com uma poderosa canção ‘post break up’, em que a neozelandesa surpreende ao conciliar uma poderosa mensagem emotiva, uma electropop vibrante e a demonstração de toda a extensão da sua entrega vocal.
Desvendado o véu de como seria o tão aguardado regresso de Lorde, a expectativa para Melodrama era enorme, pairando no ar um desejo subliminar em se querer ser surpreendido novamente por Ella, especialmente tendo em conta a elevada fasquia que a artista tinha deixado com Pure Heroine. E não é que o conseguiu?
Não acusando a pressão em suceder a um disco que se tornou tão acarinhado e estimado, Melodrama trata-se de um disco que ambiciona em superar o seu antecessor em todas as normas e feitios. Para este segundo disco, Ella não se predispôs a repetir a fórmula passada apenas com o intuito de a tornar maior e melhor. Não. Para Melodrama, Ella parte do zero e mesmo assim assina novamente uma fórmula vencedora e rejubilante para quem a ouça.
Constituído por onze temas diferentes, Melodrama gira sobre si próprio para contar a sua história, com cada canção a consistir num capítulo em que uma emoção toma a posição central no mesmo. Aliás, a forma como Lorde consegue transmitir as suas emoções para dentro das suas canções de maneira tão notável leva a que, neste disco, a diversidade entre temas seja muito maior, como se de um passaporte para conhecer todos os pensamentos residentes no estranho mundo de Lorde fosse; sem dúvida, o trabalho mais pessoal de Ella.
Neste novo disco, é também notória a evolução que se verifica a nível da sonoridade negrume característica de Lorde, explorando novos horizontes de forma a recriar o cenário ideal para as mensagens existentes em cada canção, sempre mantendo uma faceta cativante e apreendedora, assim como a música pop assim o exige. Tal como já havia feito anteriormente, Lorde consegue desafiar os limites da pop e levá-los mais além, cimentando a sua posição enquanto uma das artistas mais singelas desta atual geração.
Ella Yelich-O’Connor questiona-se sobre “what the fuck are perfect places anyway?” no final de Melodrama. Depois de uma consagrada passagem pelo Rock in Rio Lisboa, em 2014, algo nos faz querer que Lorde voltará a encontrar essa resposta em Portugal quando, em Junho, subir a palco do NOS Primavera Sound enquanto um dos nomes mais atrativos do festival do Porto.
Texto – Nuno Fernandes