Os Basset Hounds escolheram a Casa Independente para a apresentação de II, o seu segundo disco de originais, editado em abril passado, à cidade de Lisboa. Depois da estreia ter ocorrido em 2015 com um álbum homónimo, este segundo longa duração veio revelar uma banda mais madura, coesa, adulta e ambiciosa.
Antes do aparecimento em força do fenómeno da internet, a música que era dada a conhecer era definida em boa parte pelas editoras. Com isso, verificava-se um primeiro filtro às propostas musicais que iam surgindo, fechando-se a porta a algumas, abrindo a outras e noutros casos abrindo mas com certas condições. Esta situação tinha consequências, para o bem e para o mal, relativamente ao que era editado. As editoras é que decidiam quais os álbuns que eram publicados, e como eles deveriam de ser, tendo sempre presente a questão financeira.
Entretanto, surgiu a internet e a tecnologia e as plataformas digitais. Com isso, as editoras perderam muito do poder que tinham – até porque os discos deixaram de ser o principal sustento no universo da música – e a opção de gravar e editar um disco banalizou-se. Como acontece de alguns anos para cá com os livros – havendo até editoras que vivem praticamente só do permitir a qualquer um editar o seu livro – também com os discos tornou-se fácil fazer e editar um. Por outro lado, a tecnologia digital tornou acessível a gravação de um disco, mesmo para quem não tenha muitas posses – existem até discos gravados na íntegra com um simples telemóvel.
Com tudo isto onde é que se pretende chegar?! É que os Basset Hounds integram-se perfeitamente nesta nova vaga de projetos e de álbuns editados que são o resultado de tudo o que foi dito atrás. Falamos de bandas que de uma forma totalmente livre e independente, fazem a música que muito bem entendem, com o único objetivo de satisfazer as necessidades musicais dos seus membros. Como a música não é o que lhes paga as contas, estes projetos visam tão só a satisfação pessoal, não se verificando qualquer espécie de cedência ao que quer que seja. Assim, encontramos atualmente muitas propostas que apresentam canções que não pretendem entrar de rompante nos ouvidos das pessoas nem agradar a nada nem a ninguém, para além dos próprios músicos que fazem a respetiva música. Os Basset Hounds podem então ser enquadrados nesta nova realidade surgida nos últimos anos. As suas músicas não são orelhudas nem propriamente objetivas e claras, mas isso é compensado por uma maior verdade e honestidade no trabalho que apresentam.
Na sexta-feira à noite, dia 1 de junho, fomos então até à Casa Independente, no Intendente, em Lisboa, para assistir à apresentação deste segundo trabalho dos Basset Hounds, banda formada por Afonso Homem de Matos (bateria e voz secundária), António Vieira (guitarra e voz secundária), José Martins (baixo) e Miguel Nunes (voz principal e guitarra).
A Casa Independente é um dos locais que ajudam a provar que a Lisboa atual é bem mais cosmopolita do que aquela que conhecíamos até há alguns anos atrás. Assim, quando entramos e andamos pelos seus corredores e vamos até ao extraordinário pátio ao ar-livre, apercebemo-nos que muitas daquelas pessoas comunicam noutras línguas que não o português.
Passava pouco das 22h quando entrámos no salão de festas da casa, onde se iria realizar o concerto. O ambiente da sala é único, dominado por luzes vermelhas e por um tigre enorme pintado ao fundo do palco. O salão foi-se enchendo e podemos dizer que aquando do início do concerto ele encontrava-se cheio que nem um ovo. Os Basset Hounds sobem ao palco e destaca-se desde logo a t-shirt dos Onda Choc enveredada por Afonso Homem de Matos. Com eles sobe também Francisco Menezes, saxofonista que colaborou com a banda neste seu segundo disco, que foi entrando e saindo de cena durante todo o espetáculo. Sem dúvida que o saxofone acrescenta um toque jazzístico e psicadélico à música dos Basset Hounds.
O concerto arranca com “Condor”, o segundo single de II, seguindo-se “Limbo”, também do novo disco. A banda mantém-se no registo deste ano para interpretar um dos seus melhores temas, e um dos mais bem recebidos da noite, “Thin Age” é uma grande canção, que coloca o público em plena agitação. Segue-se “Ahab”, mais uma das novas, para depois retrocedermos ao disco de estreia com a interpretação de “Bossa”. O regresso ao passado foi curto, já que de seguida regressam a II para interpretarem “Arta” e “Sif”. Novo regresso ao passado com “Swallow Bliss” – dos tais temas que ajudam a comprovar o que foi dito atrás, já que se trata de uma canção pop, mas que pelo meio se perde um pouco com demasiadas variações que nada acrescentam – e “Oscilations”. Segue-se “Ouroboros”, o primeiro single de II. Na ponta final do espetáculo, tivemos “Arabica”, do álbum de 2015, os novos “Velvet” e “Babar”, para terminarem com “Over the Eyes”, do primeiro disco, talvez o tema mais bem recebido da noite.
No final temos a sensação de termos assistido a um concerto que não deve ter desagradado a nenhum dos presentes. Sem a intensidade que se vê noutras ocasiões, durante o espetáculo eram algumas as conversas em paralelo da parte do público, como que fazendo do que saia do palco uma espécie de música ambiente a um bar onde se conversa, não deixou de ser uma noite muito bem passada na companhia destes quatro senhores, mais o convidado, que primam por fazerem o que gostam e da maneira que mais lhes agrada, para além de toda a simpatia que emana da banda, com principal destaque para os principais comunicadores de serviço, Afonso Homem de Matos e António Vieira. Mas no fundo, este é um projeto em que não temos dúvidas de que a sua música resulta na íntegra da personalidade única das quatro pessoas que o formam.
Fotografia – Basset Hounds
Texto – João Catarino