Deu-se a conhecer como o cabecilha de O Terno, banda indie rock brasileira, mas foi no ano passado que Tim Bernardes aventurou-se por percursos solitários para editar o seu primeiro disco a solo, Recomeçar.
São treze belíssimas canções que enaltecem a desgraça que reside no amor. São treze capítulos na história de um homem que procurou o amor e que o encontrou, mas que o desfecho dessa descoberta acabaria sempre por culminar em ruína. São treze confissões de alguém que não tem medo em relatar as suas fraquezas e desaires. São treze suplícios por alguém que o ouça. Acima de tudo, são treze lições que tentam demonstrar o quão tumultuoso é viver, mas que nos incentivam a tentar de novo, a “recomeçar”.
Perante um disco de teor tão intimista e identificável, dada a sua dificuldade em não nos revermos em pelo menos uma das histórias de Tim Bernardes, exigia-se um ambiente capaz de fazer jus a um ambiente tão melancólico. E foi isso mesmo que se sucedeu no passado domingo pela Galeria Zé dos Bois, em Lisboa, que acolheria o artista brasileiro pela segunda vez no espaço de uma semana, fruto da pequena tournée portuguesa realizada pelo próprio.
Com o palco rodeado por múltiplas guitarras, pedais, um amplificador e o piano ‘da casa’, com Tim Bernardes a ocupar o centro, o artista brasileiro foi saudado de forma calorosa pelo público da Zé dos Bois, com o dito calor a extinguir-se por completo no momento em que Tim se solta pelas teclas do piano, soltando uma refrescante brisa por entre palavras de “Talvez”,
Uma a uma, as luzes do palco iam-se extinguido, com a exceção da que iluminava o piano. Ao fechar-se os olhos para se penetrar pelo negro da sala, recebe-se uma passagem pelos inúmeros cenários e destinos para as quais as canções de Tim Bernardes nos reencaminhem. De timbre apaziguador e doce, com um conforto emocional quase intrínseco, o arrepio na espinha desta sonoridade permaneceria intacta logo a seguir quando o piano deu lugar ao instrumento das seis cordas, com “Pouco a Pouco” e “Quis Mudar” a conseguirem multiplicar a beleza da sua versão de estúdio.
O intuito de Tim Bernardes era o de recriar o ambiente intimista que gerou as canções de Recomeçar, é certo, e para tal o artista adaptou o palco para que este se assemelhasse ao espaço mais pessoal de cada um, a de o seu quarto; “as canções deste disco foram canções que eu fui guardando ao longo do tempo e eu não sabia como as expor. Com o passar do tempo, precisava de ganhar confiança e depois do último disco de O Terno, comecei a gravar e saiu isso. Como antes só mostrava estas canções há minha família, à irmã ou ao primo, decidi então fazer estes concertos para que as pudesse partilhar com todos vocês, para que pudessem entrar dentro do meu quarto”, confidenciaria Tim Bernardes.
Como qualquer quarto que se preze, a decoração fica sempre a cabo do nosso cunho pessoal, com posters de artistas a enfeitar as paredes, por exemplo. Seguindo esta tendência, o quarto de Tim Bernardes também ele é repleto de referências a músicos que o influenciaram, como Jards Macalé, Jorge Ben, Gilberto Gil ou até os mais pesados Black Sabbath; Tim Bernardes tocou múltiplas covers, desde medleys a temas soltos, enriquecendo um alinhamento que contou com Recomeçar tocado na íntegra.
Falando múltiplas vezes com o público, destacam-se os numerosos elogios pela sabedoria e cultura do povo português, conhecendo bastantes músicos brasileiros, quando, no Brasil, se se perguntasse por um ou outro artista português, as respostas eram quase todas Capitão Fausto, gracejou. Gracejaria, também, ao apresentar a teoria da ‘faixa 9’, que consiste “naquela música do disco que você pula sempre por preferir as primeiras, mas quando se cansa delas, descobre a faixa 9 e que aquela passa a ser das suas canções favoritas do disco”, antecedendo então “Incalculável”. Incrível como, em pleno concerto, Tim Bernardes tem a capacidade de nos fazer redescobrir temas seus e o quão bonitos conseguem ser.
Quer fosse a piano ou por guitarras, Tim Bernardes despertava magia e beleza por qualquer que fosse o instrumento em sua posse, tudo enquanto a sinceridade das suas canções despertava sensações de introspeção, de um “também já senti isso” por parte de grande público da Zé dos Bois, que timidamente trauteava algumas das principais canções do músico, como “Ela”, de forma a não ofuscar a voz maestra daquela noite, que culminaria com a versão de “Recomeçar” que dá o disco, de nome idêntico, como encerrado.
Repescado para palco para um encore mais do que merecido, a noite de Tim Bernardes culminaria em tom festivo ao cantar-se os parabéns a Tim, visto que o músico completava mais um ano de vida naquele preciso de dia. Congratulou-se o seu aniversário e congratulou-se a ponte, cada vez mais cimentada, que une tanto o povo português como o brasileiro, pelo menos musicalmente falando.
Tim Bernardes sempre teve um jeito especial e bonito de falar sobre amor, mas não há sombra de dúvidas que no passado dia 17, foi toda a Galeria Zé dos Bois que saiu apaixonada perante o talento desta nova promessa da música brasileira.
Texto – Nuno Fernandes
Fotografia – João Rebelo