O MUSCARIUM, festival de artes performativas no concelho de Sintra, teve a sua primeira edição em 2015, surgindo no âmbito das celebrações dos quinze anos do teatromosca, levando espectáculos de teatro, dança e música por diferentes localidades do concelho.
Para 2018, o festival inaugurou a sua quarta edição com um concerto de Noiserv, abrindo as portas do Palácio de Monserrate para uma noite que tudo teve de bonita. Porém, antes de se passar a noite na companhia de David Santos, houve tempo para um acolhedor cocktail de boas vindas num belíssimo jardim, saboreando-se alguns vinhos da região enquanto se matava o bucho e trocava-se dois a três dedos de conversa.
Já com as portas do palácio abertas, era difícil não ficar boquiaberto com o local idílico escolhido para a ocasião, com o verdíssimo anfiteatro natural a ser um espanto para o olhar. Ao fundo, iluminado de branco e realçando o verde da natureza que o rodeava, estava uma plataforma rodeada por dezenas de instrumentos, aqueles que permitem David assinar algumas das melhores composições portuguesas dos últimos anos.
Famílias, casais e grupos amigos constituíam um público heterogéneo e respeitador, imergindo o anfiteatro num silêncio absoluto no preciso instante em que David se sentou para libertar as primeiras notas do seu conjunto de xilofones, que é como quem diz que o pontapé de saída fez-se ao som da tranquilizante “Mr. Carousel”, seguida rapidamente por “This is Maybe the Place Where Trains are Going to Sleep at Night”.
Face ao cenário relaxante e intimista que se vivia pelo Palácio de Monserrate, o ambiente por ali instalado levou a que o concerto de Noiserv tivesse inúmeros instantes de partilhas de histórias entre canções, com quase todas a gerar gargalhadas pelo público, com as das crianças a serem as mais contagiantes. Os concertos de Noiserv têm, só por si, a proeza de serem sempre bonitos, mas quando inserido numa paisagem arrebatadora como a dos jardins do Palácio de Monserrate, a coisa sobre logo para um patamar bem mais especial, especialmente ao som de temas como “Today Is The Same as Yesterday, But Yesterday is Not Today” e a portuguesa “Palco do Tempo”.
É impressionante a forma como a sonoridade de Noiserv soa tão impecável e cristalina quando transposta para palcos, com todos os instrumentos a soarem precisos quando em comparação com o seu formato de estúdio. Não seria descabido apontar o dedo à qualidade de David enquanto músico para tal causa, não se baralhando no meio de tantos loops e sons a serem soltos e a exigirem que a sua coordenação seja feita ao mesmo tempo.
Porém, a complexidade de tal tarefa embateu em alguns cómicos erros ao longo “I Was Trying to Sleep When Everybody Woke Up”, tudo fruto de uma pequena troca de efeitos num dos teclados. A partir daí, a coisa encravou e teimou em não querer andar, mas sempre num ambiente descontraído e divertido, com David a explicar a situação num misto entre embaraço e troça, com o público a rir-se sempre durante essas explicações.
Entre a melancólica “Vinte e Três” somente a piano, a vibrante “The Sad Story of a Little Town” ou no cardápio de instrumentos que dá fruto a “Bullets on Parade”, o final do concerto dar-se-ia ao som da já expectável “Don’t Say Hi If You Don’t Have Time for a Nice Goodbye”, possivelmente um dos melhores temas de David e cujo clímax representa na perfeição a singularidade existente na sonoridade de Noiserv.
Já no encore, e antes de cumprimentar quase todos os presentes na banca de merchandising, destaque para a pérola resgatada de One Hundred Miles From Thoughtlessness, “Bontempi”, que colocou um ponto final em mais um belíssimo concerto de Noiserv e estreou as primeiras páginas da belíssima história que será esta quarta edição do festival MUSCARIUM.
Texto – Nuno Fernandes
Fotografia – Luís Sousa
Promotor – teatromosca