Dezembro é sinónimo das fatídicas listas dos ‘melhores do ano’. Se, a nível de concertos, a coisa já estava bem encaminhada, o início do mês brindou-nos com o regresso de Patrick Watson a Portugal e o canadiano lá que nos trocou as voltas todas.
Três anos depois da sua última passagem por palcos portugueses, Patrick Watson voltou numa mini digressão por Lisboa, Coimbra, Guimarães e Porto, com a capital do nosso Portugal a receber o arranque, isto num LX Factory praticamente lotado por um público heterogéneo.
Antes de se matar saudades do senhor que nos aconchega o coração como ninguém em “To Build a Home”, coube a Ariel Engle, com o seu projeto La Force a assegurar a primeira parte da noite.
Com um indie pop que puxa tanto ao folk como a música electrónica, a sonoridade de La Force é aconchegante q.b., mas na vastidão de uma sala como a do LX Factory, a mesma acaba por se perder e deixar de criar o impacto previsto, ao qual se juntou o burburinho da uma sala a ficar preenchida a piorar a situação. Com a exceção de uma versão improvisada de “Purple Rain” (Prince), a francesa pouco ou nenhum efeito surtiu naquela noite.
Nem passavam das dez da noite quando a armada de Patrick Watson se instalou por um palco composto por dezenas de instrumentos que nos roubavam a vista, mas com a entrada do acarinhado, todos os holofotes passaram a centrar-se no músico que, mal começa a entoar os primeiros versos de “Love Songs for Robots”, numa versão bem mais detalhada e vívida do que à do disco a que dá nome, deixa-nos com um arrepio na espinha face à meticulosidade e emoção que coloca nas palavras.
Com o desvendar de “Places You Will Go”, quatro lâmpadas começam a rodopiar pelo palco, simulando faróis capazes de nos guiar ao porto de abrigo que é o repertório de Patrick Watson. Desde 2006, com o lançamento de Close to Paradise, que Patrick abriu a caixa de Pandora de canções sentimentais que reconfortam e que apaziguam; sessões de terapia musical, na falta de melhores adjetivos. Quando esses temas sobem a palco, é impossível não nos relembrarmos ao primeiro instante que a ouvimos, como em “Drifters”, de como se era nessa altura, e toda a transformação, a evolução que se verificou em nós até àquela noite de domingo; fosse para melhor ou para pior, mudou-se, e Watson esteve lá sempre.
Quando não nos ‘obrigava’ a fazer viagens pelo passado, Watson, sempre bem-disposto, descontraído e comunicativo, apresentava material novo, a figurar o seu próximo longa duração, que ainda não tem data prevista de lançamento. Desses instantes, o primeiro a sobressair foi “Melody Noir”, onde toda a banda que acompanha o artista – guitarra, bateria, baixo, teclados – converte-se num coro e duas guitarras acústicas para que, juntos numa meia-lua e sobre a alçada do mesmo microfone, recriassem até ao mais ínfimo detalhe a nova canção de Watson em que La Force também dá voz.
Pela falta de um novo disco no cartel, o concerto teve grande foco no último lançado pelo músico, Love Songs for Dirty Robots, soando bem mais composto e articulado do que no já longínquo Vodafone Mexefest de 2015. “Hearts” e “Bollywood”, em particular, tiveram uma atenção redobrada no detalhe, com a primeira a soar às festividades de Funeral dos Arcade Fire e a segunda a inundar o LX Factory em absorventes luzes vermelhas, tornando-se em dois dos grandes pontos altos da noite.
Já sentado atrás de um fiel piano, onde gostaríamos de o ter visto um pouco mais, ouve-se a estreia de “Broken”, um dos novos temas do artista cujo impacto emotivo quase que nos faz soltar uma ou outra lágrima.
Entrado em período de descontos, que é como quem diz no encore, chegou a surpresa bem guardada da noite: Ana Moura. Convidada de honra da noite, a fadista portuguesa juntou-se a Patrick Watson e ao guitarrista Joe Grass, cuja guitarra quase soou a uma portuguesa, para que juntos homenageassem Lhasa da Sala, através de “El Payanade”, naquele que foi indiscutivelmente o ponto alto da noite.
Depois de uma “Into Giants” a reunir a mesma meia-lua de “Melody Noir”, cujo tom festivo tornou-se contagiante ao ponto de todo o LX Factory se juntar em palmas, apareceu o percalço da noite em “Lighthouse”. Naquele que é um dos maiores êxitos do artista, e cujo piano imaculado soa ao toque dos anjos, as luzes e o som do LX Factory cessam por completo, tal como acontecera, há uns bons anos atrás, pela Aula Magna.
Se ao longo do concerto foi feita, pela parte do público, uma introspeção sobre as mudanças entre o passado e o presente, o próprio Patrick Watson seguiu esta linha de pensamento. Não querendo dar a noite como terminada por ali, e na companhia do comparsa Joe Grass, Watson começou a circular, com megafone na mão, pelo meio de um público que o banhava com a luz de centenas de microfones.
Na tela perfeita pintada por Patrick Watson, quis o destino que este momento o tingisse de preto, mas lá está, aos amigos perdoa-se tudo, e para os portugueses, o canadiano é já um dos nossos.
Promotor – Lemon Live Entertainment