Regressar aos anos 1980 não era propriamente o objetivo, mas Ian McCulloch teve a capacidade de o fazer no passado domingo. A surpresa não seria provavelmente o fator mais determinante desta noite, pois um novo álbum com músicas antigas (mais dois temas novos), e um outfit a reportar 1978 não são fatores que surpreendam ninguém. O que não estávamos à espera (pelo menos eu, que os ouvi em repeat durante toda a minha adolescência) é que este regresso seria implacável. Como se tivéssemos ficado petrificados na Rua da Beneficência, com os cabelos curtos e ligeiramente espetados com odor a sabão azul e branco, e com aquele sobretudo preto roçado com uma mescla intensa de cheiro a cerveja e a cigarro. O mesmo sobretudo que nos cobria das futuras realidades, o sermos adultos em breve. Domingo durante os 16 temas que gentilmente a banda de Liverpool nos proporcionou (com novas e agradáveis roupagens), regressámos no tempo e rejuvenescemos. Podíamos ver e sentir nos sorrisos generalizados no final do concerto, e onde o menos de positivo que ouvimos foi: – “Só faltou o Ocean Rain”.
Sim, os Echo & The Bunnymen (sempre adorei dizer o nome em português!) a banda pós-punk do bonito Ian McCulloch e o fabuloso guitarrista Will Sergeant agraciaram-nos com o elixir da juventude! Crocodiles (1980), Porcupine (1983), Ocean Rain (1984) e Echo & The Bunnymen (1987) compilados em The Stars, The Ocean & The Moon, editado em 2018. Os repetidos agradecimentos em português e em inglês no final das músicas, intercalaram com frases curtas que se cingiram “a new song”, antes de “The Sonanbulist”, ou “the old song” já no final. Mas os momentos mágicos dos acordes iniciais de “Rescue”, “All My Colours” ou “Lips like Sugar” foram mais que suficientes para perdoarmos a distância característica do homem dos lábios doces. Tal como o timbre da sua voz que, quarenta anos volvidos, continua com uma doçura quente mas irada. Rasgos de puro rock, saídos da bateria e dos movimentos solitários mas firmes da guitarra de Will Sergeant. E nesses rasgos, McCulloch mostrou-nos que ainda domina a versatilidade nas cordas vocais e consegue fazê-las vibrar com a ira e determinação exigidas por esse registo musical.
Jim Morrison e Lou Reed homenageados nos apontamentos dos refrões de “Roadhouse Blues” e “Take a Walk in a Wild Side”, subtilmente introduzidos a meio de “Villiens Terrace” e “Nothing Lasts Forever”, numa espécie de afirmação da imortalidade dos deuses do Rock N’Roll. Com uma nova roupagem em praticamente todos os hits, os Echo & The Bunnymen conseguiram polir os temas que os acompanharam nos últimos 40 anos, tornando-os ainda melhores (provavelmente será diferente a opinião dos puristas, não sei). Focos de luzes entre o azul e o verde, sobressaiam sobre McCulloch e os seus óculos escuros que não retirou uma única vez, nem mesmo quando se virava de costas para o público para beber (água?). Duplo encore , o primeiro com o arrebatador e prolongado “Lips Like Sugar” e o segundo com uma “ old song”, “Do It Clean” do álbum Crocodiles . E foi com um ligeiro(íssimo) amargo de boca que os britânicos deixaram o palco do Lisboa ao Vivo, pois ainda esperávamos ouvir “Ocean Rain”. Mas ficaram mesmo por aqui e foi tão bom. Obrigada Echo voltem mais vezes que a malta precisa disto.