Ir ver Peter Hook & The Light é, antes de mais, um exercício de revivalismo do passado e para já, não se avizinha no futuro próximo do ex-baixista dos New Order, nada de novo no que diz respeito à escrita de novas canções. Este projecto que após a saída de Peter Hook em 2009, da banda sucessora aos Joy Division, os New Order, tem assim vindo a recriar em palco eficazmente, e diria até de forma empolgada, o legado que este baixista e dos seus antigos companheiros de estúdio, criaram. Ele conhecido pelos suas melodias que, reza a história, foram desenhadas uma ou duas oitavas acima do normal no braço da guitarra baixo porque o músico não se conseguia ouvir na sala de ensaios. Peter Hook influenciou provavelmente mais baixistas do que qualquer outro músico da sua geração e continua a ser uma referência e influência pelo seu modo distinto de atacar as escalas da guitarra baixo.
Apropriadamente, Peter Hook, ao formar os The Light criou um projecto de música ao vivo onde as expectativas do público são nada mais nada menos do que voltar a ouvir as canções dos imortais Joy Division e New Order enquanto os seus ex-colegas, Sumner e companhia, continuam no caminho lógico e mais certinho de terem a obrigação de continuar a dar canções novas aos seus ouvintes de tempos a tempos.
A primeira vez que vi Peter Hook ao vivo, eu era ainda estudante e foi depois de um dia de aulas que já no Metro, decidi sair nos Restauradores e entrar na extinta Virgin Megastore. A caminho de picar alguns discos, fiquei por ali, naquela zona onde também estava a saudosa Bimotor e entrando no paraíso dos CDs, oferecido por Richard Bronson, deparo-me, sem ter qualquer conhecimento prévio disso, com um concerto dos Monaco prestes a iniciar. Para quem não sabe ou não se lembra, porque o projecto não foi muito bem recebido em Portugal numa altura em que a juventude andava toda de camisa de flanela a ouvir o Kurt Cobain e derivados, os fans de Joy Division não viam com muito bons olhos esta incursão de Hook na pop dançável, ainda mais descaradamente pop do que a feita pelos New Order. Os Monaco, foram um projecto de curta vida, na altura, tinham acabado de lançar Music for Pleasure e deram, um concerto muito animado e interessante naquela loja de discos. Para mim, pessoalmente, considero uma sorte ter assistido e comprei efectivamente o disco ao sair daquele espaço. Podem perguntar porque estou a recordar isto, ora porque na primeira parte do set na Aula Magna dedicada ao disco 1 da compilação Substance dos New Order, ou seja, à recriação mais ou menos exacta desse alinhamento de canções, vejo a mesma postura de Hook e comparsas que vi muitos anos antes naquele showcase na Virgin Megastore. Já na Aula Magna: dois baixos em palco, o de Hook e o do novo baixista Yves Altana (também por cá conhecido por ter tocado bateria nos Chameleons Vox), na guitarra e voz, pareceu-me ser David Potts, precisamente companheiro de Hook nos Monaco, que nesta primeira parte dedicada aos New Order, emprestou a sua voz de Tenor mais vezes, e desse modo fez mais justiça aos vocais originais de Bernard Sumner. Tudo soou bem e apropriado até porque a música dos New Order até parecia ter sido feita para ser tocada por estes músicos. Neste set inicial, dedicado portanto aos New Order, pudemos ouvir mais do baixo de Hook , um pouco mais liberto das vocais, mas sem deixar de ser um frontman muito característico e agregador de todas as atenções.
O clima de festa instalou-se com temas como “Blue Monday”, “Bizarre Love Triangle”, ou o fenomenal e sempre clássico “True Faith” a encerrar o primeiro set da noite. E, uma hora e vinte minutos depois de terem tocado a compilação Substance dos New Order, haveriam de voltar ao palco após um longo pedido de encore do público para debitarem todos os temas da compilação irmã de Substance dos Joy Division e ainda mais alguns. Mal começaram com “Day Of The Lords”, até me esqueci que estava na Aula Magna, sitio bem “comportadinho” com cadeiras e logo sorri quando vi uma ou duas pessoas com ar de professores universitários a imitar as danças de Ian Curtis. Só mesmo a honestidade vocal de Peter Hook cuja voz grave aqui se adequa melhor às vocais, a proficiência dos músicos em palco me fizeram aguentar o cansaço da semana sem sequer sair para apanhar ar nesta segunda parte emocionante. É o legado Joy Division, e por mais que aprecie num dia de Verão a brilhante pop descomplexada dos New Order, nada chega aos pés disto. Estas canções foram feitas para serem tocadas em palco apesar de mistificadas originalmente pela produção brilhante de Martin Hannett, isto sim, é absolutamente brilhante em palco. Aquele baixo inicial em “Shadowplay” continua sempre a ser arrepiante, e nem sequer me queixo (muito) da falta de graves no PA da sala. O som podia estar um pouco mais forte, ou então, estou a ficar surdo, é também uma possibilidade. O punk rock de “Warsaw”, “Dead Souls”, “Transmission”, “She´s Lost Control” ou a belíssima “Atmosphere” dedicada a Ian Curtis, foram alguns dos meus momentos favoritos neste segundo set, que no total contou com mais 13 temas ali tocados de seguida. O final teria que ser com “Love Will Tear Us Apart”… e depois cá fora, claro, comentava-se que o primeiro set tinha sido muito bom, mas os segundo com Joy Division é que tinha sido o melhor da noite. Concordo completamente e até poderia resumir tudo assim, não fosse a necessidade de ilustrar para quem lá esteve recordar ou para quem gostava de ter ido e não foi, como foi esta passagem mais por Lisboa de Peter Hook & The Light. No fundo, os temas de New Order e Joy Division ganharam nova vida, em especial pela preocupação de Hook em os recriar o mais próximo dos discos, sem perderem nada em palco. E sejamos honestos, ao ir ver um concerto dos New Order por exemplo, surge sempre na expectativa do público que os músicos toquem um ou dois temas de Joy Division. Aqui temos o bolo todo: É revivalista é certo, mas também é muito bom e sabe bem ir assistir a um concerto assim.