Não há duas sem três, e como tal, o fatídico dia do NOS Primavera Sound lá que chegou, com muita pena nossa, apesar do cansaço começar a falar mais alto com o aproximar do fim. Porém, esse teria que esperar um pouco, ou não fosse o terceiro dia do festival aquele que reunia a oferta mais eclética dos três dias.
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Numa edição ‘assombrada’ pelo mau tempo – este último dia contou só com uma ventania irritante – e pelos cancelamentos de 5 artistas, nomeadamente Ama Lou, Lizzo, Kali Uchis, Mura Masa e Peggy Gou, a organização do NOS Primavera Sound decidiu oferecer um miminho ao seu público e, em jeito de surpresa, colocou Shellac, a veterana banda repetente de todas as edições do festival, a tocar junto à zona da restauração.
Voltados para o cartaz ‘oficial’, e no preciso momento em que o relógio marcava as cinco da tarde, deu-se uma viagem intercontinental pelo Parque da Cidade: de um lado, tinha-se O Terno a representar o Brasil, enquanto Lena D’Água e Primeira Dama lideravam a frota portuguesa.
+ fotos na galeria NOS Primavera Sound’19 dia 08Jun Lena D’Água e Primeira Dama
Ícone da música portuguesa, ou não tivesse sido a primeira mulher a dar voz a uma banda portuguesa, isto nos anos 70, Lena D’Água juntou gerações em frente ao Palco Super Bock para acolher o regresso ao ativo desta embaixadora da pop nacional. Deliciando-nos com vislumbres do seu novo disco, como foi o caso de “Grande Festa” e “Hipocampo”, mas não esquecendo as músicas do passado, como o singalong em “No Fundo dos Teus Olhos de Água”.
Abandonada a pop portuguesa ternurenta de Lena, viajou-se até à Suécia – vá, até ao Palco Seat – para um cenário completamente distinto: o violento e irreverente punk dos Viagra Boys.
“Boa tarde, Barcelona! Isto é incrível, nunca tinha estado em Espanha!”. Esta tirada de Sebastian Murphy até que resume a humorística atitude ‘não quero saber’ de Viagra Boys em palco, à qual se juntaria uma comparação entre o NOS Primavera Sound e o Woodstock ’92, festival que nunca aconteceu. Mas sempre foi desta irreverência que o punk se foi fazendo, não foi?
A atitude punk estava no sítio e no que toca ao look, essa também não esteve em falta, ora calça fato de treino da Adidas, a barriga a tombar de tanta cerveja que carrega, tatuagens de perder a conta e uma garrafa de vodka que acabou nem a meio do concerto, os Viagra Boys vieram ao Porto numa de causar a barafunda com o seu caótico disco de estreia Street Worms, onde temas como “Sports” certamente que não deixaram ninguém indiferente.
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Estrearam-se em Portugal o ano passado, mas foi estreia com sabor agridoce, visto que a doença do guitarrista Buck Meek impediu de marcar presença. Desta feita, os Big Thief apresentaram-se (finalmente) em colectivo a Portugal, com uma considerável enchente no Palco Seat para recebê-los.
Ora tenha sido pela falta de uma guitarra, que levou a que a vocalista/guitarrista Adrianne Lenker tivesse que correr pela vida e fazer com que o seu trabalho valesse por dois, ou pelas dimensões do palco principal do Vodafone Paredes de Coura tenham feito que a coisa de perdesse por ali, o último concerto dos Big Thief soube a pouco. Felizmente que pelo Porto, a conversa foi outra, ou não se tivesse ouvido uma banda em total harmonia. E soava tão bonito.
No meio de um indie ora rock ora folk, que tanto origina melancólicos solos como silêncios reconfortantes e que apenas são rasgados pelo sentido pesar nas palavras que Lenker profere, o concerto fez-se à volta dos três registos da banda de Broklyn, apesar do mais recente U.F.O.F. não ter tido direito a grande estrelato. Quiçá esse não esteja reservado para daqui a uns anos, ou não fossem os Big Thief um dos melhores projectos a que se tenha deitado as mãos nos últimos tempos.
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Acreditamos fielmente que o público de Jorge Ben Jor se dividia em dois fracções: a primeira seria uma legião de fãs devotos que há muito aguardavam por aquele momento; já a outra, curiosos e desconhecidos que não faziam a mínima ideia de que “Mas Que Nada” era de sua autoria. No final, ambas as partes celebraram.
O calor brasileiro de Jorge Ben Jor não demorou muito a instalar-se, ou não fosse a sua sonoridade uma floresta tropical que tem como principal fauna o samba e o bossa nova. Haveria estilos mais propícios para que fosse feita uma festa de final de tarde? Julgando pela cara de felicidade dos milhares de pessoas que dançavam em frente ao Palco NOS, é difícil dizer que não.
No pico dos seus 74 anos, o carioca e a sua extensa banda – secção de metais incluída – reviveram êxitos de uma carreira com mais de cinco décadas de existência, como “País Tropical”, “Magnólia”, “Fio Maravilha” e claro “Más Que Nada”. Ao longo de uma hora, cantou-se, dançou-se e, acima de tudo, festejou-se. E é assim que tem que ser feito num festival.
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Apesar da diversidade existente no cartaz, o NOS Primavera Sound sempre foi um refúgio para os amantes de projectos indie rock emergentes. A liderar essa frente, este ano, esteve Snail Mail, o alter-ego de Lindsey Jordan.
Nascida do final dos anos 90 e apesar dos seus tenros 19 anos de idade, as canções de Lindsey tanto têm o toque ingénuo de quem ainda agora acabou de sair da adolescência como vive das influências das estrelas da década em que nasceu; é impossível não sentir o toque a Pavement, Sonic Youth ou The Cranberries. Ainda só munida de Lush, um dos grandes álbuns do ano passado, para apresentar, Snail Mail trouxe uma revisão à matéria dos anos 90, e o Palco Pull & Bear esteve bem atento à lição.
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Nem a menos de uma hora se estava da subida ao palco e já era difícil encontrar lugares depois régie. A afluência era tanta ao ponto de quase nos esquecermos que a suposta headliner deste dia 8 era Erykah Badu. E até era, mas quem foi coroada rainha do NOS Primavera Sound foi (la) Rosalía.
De um dia para o outro, que é como quem diz quando lançou El Mal Querer, Rosalía passou do segredo da Catalunha para as luzes da ribalta, assinando sucessos com nomes como J Balvin e James Blake, tudo isto enquanto levou a crítica a perder-se de amores por si. A abordagem pop que juntou ao flamenco é um dos principais culpados perante tanto burburinho, elevando-a a um patamar de nova ídolo pop, como tão bem ficou comprovado pela enorme legião de fãs que arrastou para o Palco NOS.
Esses fãs, devotos e apaixonados, vibraram do início ao fim, chegando quase a fazer parte do próprio espectáculo, ou não batessem palmas de forma idêntica às castanholas soltas pelo computador de El Guincho. Mas não eram só as palmas: as letras na ponta da língua, a euforia desmedida, o som do palco que não conseguia abafar o público… foi tudo. O regresso de Rosalía a Portugal fez-se numa celebração constante, em que cada genuíno “obrigado” da artista era recebido de forma tão entusiasta que a própria quase se comovia.
A abrir o serão houve “Pienso en tu Mirá”, onde o refrão lançou meio público a soltar compulsivamente. Desde “Que no Salga la Luna”, com a sua forte presença flamenca a remeter-nos para as ruas da Catalunha, até aos rasgões electrónicos que levam às danças de “Di mi Nombre” e “Bagdad”, Rosalía manteve o NOS Primavera Sound em total êxtase, estando irrepreensível no que tocava à voz. Porém, o espetáculo cénico deixou algo a desejar, ficando aquém da graciosidade das referências do universo pop nos dias de hoje. Perdoamos-lhe este detalhe, ou não estivesse Rosalía ainda numa fase de crescimento perante a estrela que tudo tem para ser.
Para o final, “Com Altura” (J Balvin), “Aute Cuture” e “Malamente”, os três monstruosos sucessos de Rosalía, colocaram ponto final num concerto que facilmente será recordado como um dos grandes deste ano. Depois de ter estado por Braga e agora no Porto, tudo nos leva a apontar que a próxima paragem da espanhola em palcos portugueses seja por Lisboa. Quiçá já para o ano…
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É sempre um enorme pesar aquele que sentimos quando nos deparamos com cenários idênticos àquele que se vivia por Kate Tempest: um Palco Seat praticamente às moscas a acolher mais um concerto de ‘C’ grande da dupla nomeada ao Mercury Prize.
Depois de ter surpreendido tudo e todos no Vodafone Paredes de Coura, em 2017, a sobreposição com Rosalía levou a que londrina não tivesse a mesma sorte na sua segunda passagem por Portugal. Todavia, quem marcava presença, certamente não estava arrependido da sua escolha, com Tempest a fazer jus ao seu nome, tal não era a tempestade de rimas e batidas que tinha abatido o local. ´
Incendiária como já lhe é hábito, Kate agiganta-se em palco e dispara em todos os sentidos com as flamejantes palavras que constituem o seu spoken word, embora que ao vivo os beats que lhes sustentam de base dão uns certos contornos de hip hop à coisa. Mas o nome que se dá àquilo que se ouve de Kate Tempest nem é o mais importante: aquilo que interessa é escutar, refletir e saber que a música ainda é uma arma. Esperemos que a chama da londrina nunca se apague.
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Três dias de festival esgotam qualquer um, é um facto, e o conforto do lar tornava-se cada vez mais apetecível à medida que a noite ia a dentro. Contudo, o Palco Super Bock tinha Low no cartaz, tornando-se então a banda de Minnesota os anfitriões da despedida da Música em DX pelo NOS Primavera Sound.
Apresentando-se em contraluz, os feixes luminosos que eram emancipados do palco prendiam qualquer um pela genialidade e delicadeza que é praticamente adjacente a qualquer concerto da banda. Porém, era dentro das instâncias de penumbra que o slowcore dos Low surtia o efeito desejado, sentindo-se todo um vasto leque de emoções ou sensações no soltar de cada nota pertencente ao mais recente (e aclamado) Double Negative.
Traduzido à letra, Low seria ‘baixo’, mas a aposta de terminar a noite na companhia dos autores de “Lullaby” fez com o que ponto final da nossa passagem pelo Parque da Cidade fosse ‘em altas’. Até à próxima, Porto. Até para o ano, Primavera!
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Evento – NOS Primavera Sound’19
Promotor – Pic-nic Produções, S.A.