Milton Nascimento deixou a sua marca na passada quarta-feira no Coliseu dos Recreios em Lisboa, num concerto que serviu para celebrar o Clube de Esquina, projecto que foi marcou por dois discos e que marcou uma era da Música Popular Brasileira. Um concerto que contou com vários pontos altos e com convidadas, neste caso, Carminho e Fafá de Belém.
Se do lado de fora do Coliseu, na Rua das Portas de Santo Antão, as atenções estavam voltadas para uma pequena manifestação a apelar para que o Milton Nascimento não tocasse em Israel no dia 30 de Junho, no interior as cadeiras iam sendo compostas de fãs que vinham assistir ao regresso do artista brasileiro. Entusiasmados por fazer uma viagem no tempo, neste caso ao Clube de Esquina 1 e 2, trabalhos editados e lançados ao mundo em 1972 e 1978, sendo que pelo meio obtivemos o reconhecimento internacional do artista, com outros trabalhos como o Milagre dos Peixes, Minas ou Geraes, para destacar.
Com uma ovação de pé logo à entrada, o Coliseu a meia casa sentou-se tal como o Milton. Cantar sentado não implica que seja menos emocionante. De todo, há uma veneração/carinho/admiração de todos os que assistem o “Bituca“, que começa com o Tudo o que você podia ser e Nada será como antes. Uma voz dona e senhora do Coliseu que parece imortalizar ao longo dos já 76 anos que já tem. Ainda que se note que a idade já pesa, basta fechar os olhos e sentir a voz ímpar do artista para perceber que o seu legado já é imortal.
Percorrer este ponto alto da carreira, neste caso, os Clubes de Esquina – se é que é válido dizer assim no plural – é saber que vamos ouvir temas como o Cravo e Canela, o Um girassol da cor do seu cabelo e Dos Cruces, que mostram uma variedade de referências do artista, tomando como seus influências sul-americanas e latinas.
Mas quem fala de Milton também é imperativo falar da banda que o acompanha. A meio do concerto, com a oportunidade de sair do palco, os holofotes centram-se na banda. José Ibarra, que às tantas ainda nem era nascido no lançamento dos dois Clube de Esquina, mostrou ao público as suas capacidades vocais com o San Vicente, o Trem de doido e Estrelas.
Tudo isto serviu também para ganhar energia para o que vinha aí. Milton entrou com Carminho em palco, onde se ouviu Cais, onde Milton levou ao rubro o público, com um registo que espantou todos os intervenientes no auditório, mas Encontros e Despedidas. Uma relação transatlântica bonita e íntima esta a que se viu no palco.
Por sua vez, Fafá de Belém trouxe o seu registo de festa, muito do seu apanágio para o Coliseu, onde ninguém ficou sentado. Depois de temas como o Nuvem Cigana ou o Lília – a canção sem letra dedicada à mãe, porque não há palavras que a descrevessem – Fafá com o Maria Maria fez com que o carnaval em Lisboa tivesse quase ao virar da esquina.
O Trem azul, tema que consagrou a noite com todos em palco, (antes do encore com o Ponta de Areia e Paula e Bebeto), foi um pretexto para perceber que serão poucas as possibilidade que teremos de voltar a ver um artista que é da máxima importância na história da música brasileira, pelo seu contributo, pelo seu carisma e pelo seu legado. E nós tivemos oportunidade de ver, sentir e aplaudir.
Fotografia (capa) – João Couto