O último dia desta edição do NOS Alive era o mais eclético no cartel, reunindo nomes capazes de agradar a todos os gostos. Como tal, não surpreendeu ninguém quando foi anunciado, um pouco depois da hora de almoço, que o dia estava esgotado. Realmente, sentia-se uma maior afluência, mas não a sufocante de anos anteriores.
Num dia bem mais fresco do que os outros dois, andou-se cedo pelo recinto na tentativa de queimar as cervejas das noites anteriores e para aquecer um pouco o corpo. Entre nós, milhares eram já aqueles que andavam pelo recinto em busca dos melhores brindes, ou não fosse sábado dia de dizer descanso ao trabalho. Mas não ao nosso; esse estava prestes a começar.
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Para este último dia, o nosso roteiro começou bem cedo e na companhia dos Rolling Blackouts Coastal Fever e da sua boa onda indie australiana.
Tipos dados a poucas excentricidades, logo comprovadas a partir do momento em que eram os próprios a fazer o soundcheck ou pela forma como ia partilhando a voz principal, o serão foi de agradável descontração, desde a entrega de alegres canções como “Talking Straight” ou pela procura da melhor tosta mista de Lisboa.
De forma breve, os Rolling Blackouts Coastal Fever conquistaram-nos pela simplicidade, mas ao mesmo tempo bem vívido, do seu indie rock que, apesar de não ter nada de revolucionário, não perde o factor de ser uma boa escuta.
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O Palco NOS Clubbing é intrínseco à música electrónica, tornando-o ponto turístico em horas mais noturnas. Porém, a nosso passagem por este palco fez-se cedo para acolher Golden Features.
Escondido por trás de uma dourada máscara, Thomas Stell trouxe um techno bem madrugador ao NOS Alive, presenteando-nos com um sunset electrónico com sabores de brunch. Apesar de tímido, houve quem mexesse um ou outro pézinho de dança, mas acima de tudo, ganhou-se ímpeto e energia para um dia que seria intenso e repleto de bons concertos.
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“Pessoa X marcou-se como segura durante terramoto no Passeio Marítimo de Algés”. Não ficaríamos surpreendidos se este fosse o estado moda no Facebook após o concerto de IDLES. E se não foi, provavelmente se deve pela falta de telemóveis que se partiram ou se perderam em tal batalha campal.
Falha-nos a memória quando nos tentamos lembrar de tal cenário de pancadaria pelo palco secundário do NOS Alive. Mas tudo batatadas amistosas, claro, como as típicas entre irmãos. Mosh e crowdsurf foram constantes no regresso a Lisboa dos IDLES, cinco tipos britânicos que têm mais pinta de quem é expulso de pubs do que quem enche Palcos Sagres pelas costuras. Mas assim foi.
Banda sensação de 2019, os IDLES passaram, isto no espaço de um ano, de um NOS Primavera Sound vazio para um NOS Alive cheio. Pelo meio, saiu Joy as an Act of Resistance, e o mundo parou perante tal disco que recorre a um punk furioso capaz de exprimir a raiva e frustração da classe trabalhadora de uma Grã-Bretanha assombrada pelo Brexit. Talvez por isso, muitos dos que invadiam o Palco Sagres, aqueles que apararam a queda no crowdsurf do guitarrista de IDLES em “Never Fight a Man With a Perm”, tinham o inglês como língua nativa.
Por mais guerrilheiro que o punk dos IDLES aparente ser, com “Mother” e “I’m Scum” a comprovarem-no, este vira às costas à anarquia para abraçar a união e, em certa medida, até o amor. A masculinidade tóxica não tem lugar em IDLES – “sou feminista” diz Joe Talbot – e não há cá vergonhas de se cantar Adele ou Sinéad O’Connor, numa divertida partida em “Love Song”.
Para se guardar um bom lugar em Bon Iver, abandonou-se IDLES momentos após a barafunda de “Danny Nedelko”, sempre com um (respeitoso) estado de caos instaurado. Definitivamente, uma das bandas que mais precisávamos de ter entre nós.
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Um dos nomes fortes deste dia 13, os Bon Iver regressaram a Lisboa depois de uma prolongada ausência, atenuada pela passagem pelo Porto no ano passado, como headliners do NOS Primavera Sound.
Em vésperas de lançamento de novo disco, i,i, nada se ouviu do sucessor de 22, A Million. Aliás, o concerto do NOS Alive foi como uma espécie de virar de página na vida dos Bon Iver, tocando-o praticamente na íntegra.
Depois de uma emotiva fase de folk, comum aos dois primeiros discos, onde os desamores de um homem de coração partido eram o tema que os unia, Bon Iver – ou melhor, Justin Vernon – expandiu-se por outras questões e outras sonoridades, abrindo portas à electrónica experimental do terceiro disco. Apesar das antíteses sonoras entre cada fase, o conjugar de ambas em palco resulta na perfeição; se “Minnesota, WI”, “Towers” ou “Blood Bank” mostram a faceta de um homem abatido, “715 – CREEKS” e “29 #Strafford APTS” dão-nos a conhecê-lo de forma mais detalhada, quiçá como pedido de auxílio de quem se quer sentir inteiro novamente.
Acima de um serão de canções, um concerto de Bon Iver é uma experiência, onde cada tema se desenrola sobre outro de forma a de construir uma linha narrativa; e nesse aspecto, é preciso saudar como nenhuma canção, como “Creature Fear” ou “Calgary” soou desenquadrada.
O problema deste (belo) conto foi ter um festival como seu cenário, onde o consumo rápido é regra, especialmente num público como o do NOS Alive. Para isso, a resposta dá-se através de “Skinny Love”, êxito que catapultou Justin Vernon do aconchego de uma eremita cabana para os grandes palcos, embora a preocupação tenha sido mais em gravá-la do que senti-la.
Para o fim, e já depois de canções que “podem acender uma erva” ou “ser ouvidas ao lado de quem vos é querido”, “22 (OVER S∞∞N)” fecha mais um capítulo na história dos Bon Iver. Em Agosto, abre-se um novo, e com ele o desejo de um regresso em nome próprio.
Depois do embalo de Bon Iver, seguiu-se caminho para registos completamente diferentes no Palco Sagres, isto na companhia da colorida pop de Marina (que perdeu o sufixo de ‘and the Diamonds) desde a última vez que passou por Portugal.
“Há por aqui rapazes primadonnas? Há por aqui raparigas primadonnas?”. Foi com este mote que fomos recebidos por Marina e uma trupe de acérrimos fãs que vibrava ao som de “Primadonna”, apesar de uma tenda com o seu quê de despida.
Ícone da pop alternativa, era evidente que quem festejava no Palco Sagres há muito aguardava pelo regresso de Marina. Para este seu quarto disco, LOVE + FEAR, ex senhora Diamonds apostou num registo mais simplista, não havendo músicos em palcos – as canções já se encontram pré gravadas. O contraste neste ‘less is more’ dá-se pela presença de quatro bailarinas, onde duas inclusive tratam dos coros, isto a par das frenéticas primeiras filas que não paravam um segundo.
Mesmo com o auxílio de terceiros, a estrela deste espectáculo é Marina e mais ninguém; ora fosse pelos impressionantes agudos de “Savaves” ou pela correria desalmada junto às grades em “How to be a Heartbreaker”. Se em “Primadonna” pede que a adorem, no NOS Alive Marina foi venerada.
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Chegou a hora da escolha ingrata. Dolorosa até; The Smashing Pumpkins ou Thom Yorke? Se por um lado temos uma banda marco dos anos 90, no outro tínhamos o cabecilha de uma das mais aclamadas bandas que já existiu. Como tal, e sabendo-se que ambos os concertos exigiam a nossa entrega total, a curiosidade em descodificar o projeto em nome próprio do vocalista dos Radiohead falou mais alto. Decisão tomada, rumou-se ao Palco Sagres de coração apertado, sabendo-se que a trupe de Billy Corgan daria um dos concertos do festival. E o diz que disse assim o confirma.
Uma hora e picos depois e tinha-se um coração que transbordava emoção, corpo todo arrepiado e o sufoco de não saber como interiorizar a magnitude de tal feito; Thom Yorke justificou toda a genialidade e deu um concerto directo para a história de todas as edições do festival de Algés.
Os indícios no ‘antes’, levantavam alguns receios, como uma tenda com muito espaço por preencher e referências a Radiohead aqui e acolá – isto foi para ti, miúda com “Karma Police” escrito na testa. Mas no momento em que o relógio dá as doze badaladas, toda a atmosfera muda para mergulhar dentro do imaginário de Thom Yorke.
É de guitarra a peito que se tem uma imagem nítida de Yorke na nossa memória. Essa desfaz-se rapidamente mal as primeiras notas de “Impossible Knots” e “Black Swan” se propagam pela agora imensidão no Palco Sagres: a música electrónica apropriou-se de Thom Yorke, e cada beat torna-se em toques de magia.
A linha de pensamento electrónica por trás de Kid A é aqui expandida, fruto da evolução das tecnologias ao longo dos últimos quase 20 anos. E é graças às mesmas que se vê Thom Yorke no seu estado mais livre e solto, dando asas à criatividade e felicidade de um artista que sempre sonhou ter carta branca em loja de tintas, telas e afins. Essa criatividade é também exemplificada através das projeções abstratas emitidas na gigante tela que decora o palco, sincronizadas ao mais ínfimo beat ou luz que exista na mente de Yorke.
Mas engane-se quem pense que isto é electrónica para dançar; nem Thom Yorke seria vulgar a esse ponto. A sonoridade que aqui reside não é vistosa porque se quer afirmar como artística; não, é vistosa porque dá forma e corpo ao inconsciente de quem encontra na música o seu refúgio. Aquele momento era dos incompreendidos, e ninguém arredaria pé da presença de alguém que sempre fez canções para serem entendidas, mas agora, fá-las com o intuito de serem sentidas.
E assim foi. Tudo era sentido e absorvido. Até poderia não ter esse intuito, mas soube quase a terapia, daquela que nos levou às lágrimas em “Dawn Chorus” e acorda-nos para a vida no abanão eletrizante de “Default”, tema de Atoms for Peace. Não houve nenhum tema de Radiohead, mas ninguém lhe pediria isso quando tinha acabado de nos dar o concerto da noite.
Em ano de celebração dos seus 30 anos de carreira, o Palco NOS encheu-se para soprar as velas com os The Chemical Brothers.
Pioneiros do movimento electrónica de massas, os britânicos fizeram do Passeio Marítimo de Algés uma discoteca a céu aberto, sugando o resto das energias que o público retinha destes alucinantes três dias logo ao som de “Go”. Com temas de dança intergeracionais, como “Galvanize” ou “Hey Boy, Hey Girl”, ninguém arredou pé nesta revista por todos uns grandes pontos na choruda carreira dos The Chemical Brothers, onde até houve tempo para remixes de outras referências no mundo da electrónica, como “Temptation” de New Order.
Contando com uma vistosa narrativa visual, onde se juntava um jogo de luzes capaz de tirar o máximo proveito das capacidades do Palco NOS, o último dia do NOS Alive terminou em festa. Já com olhos postos no futuro, aguarda-se em êxtase pela edição do próximo ano, cuja confirmação do regresso dos Da Weasel aos palcos, já nos deixou em contagem decrescente para 2020. Até para o ano!
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