O musico compositor australiano Nick Murphy esteve em Portugal esta semana (1 e 2 de Outubro) para dois concertos em nome próprio, que é como quem diz, em nome verdadeiro. Os Coliseus de Lisboa e do Porto receberam os dois primeiros concertos da tour europeia que assinala a promoção do seu segundo longa-duração, Run Fast Sleep Naked.
Nicholas James Murphy tentou descolar-se da pele de Chet Faker, nome que o projectou e o manteve nas luzes da ribalta, na verdade até hoje. Em 2011 com 23 anos colocou na internet uma versão dos Blackstreet, “No Diggity”, que rapidamente se tornou viral atingindo milhões de visualizações, tendo sido a música escolhida para o Superbowl em 2012. Seja a sua música com registos de electro-soul ou de electro-pop com doses qb de R&B, ou com uma pitada de pop-rock, com uma certeza saímos do Coliseu dos Recreios na 3ª feira passada, a de Nick Murphy (fka Chet Faker) é um músico completo. Não no sentido de que “vai a todas”, mas no sentido que consegue dar corpo aos espaços deixados entre géneros musicais, conseguindo quebrar barreiras mais conservadoras. Originário do jazz por influências familiares que deixaram marcas nas suas composições, Nick Murphy (re)criou a sua identidade desafiando estilos e (re)inventando sonoridades que o colocam hoje num patamar claramente distintivo, e isso foi notório no Coliseu. Não esgotou por muito pouco e o publico que encheu a sala venerou-o.
O seu amigo e conterrâneo Cleopold abriu as hostes para uma sala que foi enchendo e que o acarinhou mesmo não conhecendo o seu curto reportório. Foram quase 45 minutos à espera que aparecesse algum tema com uma sonoridade diferente, mas isso não aconteceu. Músicas demasiado idênticas entre elas e a fazerem lembrar tantas outras que já se ouvem por aí. Voz meio Blake, com algumas tentativas entre o quente do grave e o fresco do agudo, sem uma definição assumida. No entanto acabou por lhe correr bem, dadas as características da sala (sempre é o Coliseu!), e a generosidade de um público que se tornou volumoso ao longo da sua actuação.
Entre Cleopold e Nick Murphy foi uma infinidade de tempo. Mesmo com alguns assobios e tentativas de bater o pé no soalho de madeira, estivemos 30 minutos a sofrer com o calor (os bares encheram) e a ansiedade. Finalmente as luzes desceram e o moço da barba ruiva entrou sozinho em palco com a guitarra e arrancou com “Hear it Now”, do novo álbum. Antes de lançar as feras com dois dos seus maiores hits, apresentou-se e disse que iria tocar umas canções que escreveu durante a sua breve existência (31 anos) neste planeta. E já com a banda em palco, pôs aquela massa de gente em êxtase com os inconfundíveis temas de “Gold” e “1998” (Built on Glass, 2014).
Para Nick Murphy será sempre uma tarefa árdua, a de despir a pele de Chet Faker, pelo menos o alinhamento revelou isso. Apesar de Run Fast Sleep Naked se demarcar das texturas mais electrónicas, caso de “Believe Me” (que tocou com Cleopold) ou de “Harris Takes Drugs on the Weekend”, onde o piano e o saxofone têm presenças mais audíveis, Chet Faker esteve ali. A vibrar nos samplers e com os sons mais eletrónicos de pista de dança, com “Trouble with Us” ou “Birthday Card”.
Entre a guitarra, as teclas ou o piano (para cima do qual atirava o seu casaco amarelo cada vez que ia tocar), foi neste último que Nick Murphy se tornou mais sincero. Apesar das vibrações que transmitiu enquanto improvisava com o electro sound, no piano despiu-se da euforia e mergulhou numa outra realidade mais crua e sentida.
Entre o estridente e o tranquilo, o público venerou o rapaz da barba ruiva sem hesitações. Veneração tal, que um simples levantar de braços ou um abanar de anca era o suficiente para provocar uma subida abrupta dos decibéis. A efusiva manifestação do público quase que roçou a histeria colectiva, signifique isso o que significar. Hora e meia depois e sem percebermos muito bem a retirada em palco, Nick Murphy terminou como começou, com “Sanity” um dos singles do último trabalho. A multidão saiu lentamente sem pressas e, pelos comentários, bastante satisfeita com o que viu.