Hora de ouvir o terceiro disco dos portugueses IAMTHESHADOW, banda cujo mentor Pedro Code, faz uns poucos anos, iniciou, numa linha diferente, digamos assim, paralela a um outro projecto seu, The Dream Collision -, mantiveram-se as paisagens soturnas com pianos ou teclados em que existiria certamente na sua visão, espaço para outros diálogos a acompanhar a sua voz profunda de barítono, com o seu modo vincado de cantar. Certamente os ritmos eram mais upbeat numa estética dark wave com espaço para as suas guitarras e outros instrumentos, desenhando-se portanto a necessidade de uma banda para o acompanhar em estúdio e claro, nas aparições que este projecto protagonizaria em palco sendo raras em Portugal para um público selecto ou sedento de novidades no âmbito dessa estética em eventos de culto, ironicamente mais frequentes fora do país no resto da Europa em festivais ou eventos dedicados ao género onde lentamente, mas a passo firme a banda foi ganhando divulgação tanto pela presença dos seu membros nas redes sociais para o efeito, como através da sua ligação editorial com a label francesa North Shadows Records. Entram Vitor J. Moreira e Herr G respectivamente nos teclados e guitarra baixo, para junto com Pedro Code desenvolverem essa sonoridade em palco ou em disco.
Ouvindo o terceiro longa duração Pitchblack, o primeiro para a label alemã Cold Transmission e após uma semana de praia onde os Depeche Mode foram a mais frequente companhia das minhas escolhas sonoras nos meus earbuds é com espanto e agradável surpresa que entro no groove insano de “Lifeless”, segundo single da banda para este trabalho e que abre o disco com um vibe instrumental que certamente me fez lembrar a mestria dos mesmos Depeche Mode nos ritmos infecciosos, é uma canção infecciosa no groove que transmite com a voz de Pedro Code, especialmente no verso, a usar uma métrica que David Gaham não desdenharia de todo. ‘Infecciosa’, também é uma escolha de palavras curiosa nos tempos em que vivemos, adiante. Para a canção número dois, o belíssimo “Always”, que quando ouvi já em tempos de pandemia com a sua melancolia inerente conquistou-me de imediato: arranjo e nota dez para a linha de baixo de Herr G, que transporta a canção com os lindíssimos teclados de Victor J. Moreira as guitarras ambientais de Pedro Code, aqui na minha opinião é provavelmente a mais bonita canção que já ouvi dos IAMTHESHADOW, sim o nome deste projecto escreve-se em maiúsculas, daquelas, que faz lembrar a célebre frase de Leonard Cohen que assim também deve ser lida, sentida: “não sei de onde vêm as boas canções, se soubesse era um sitio que visitava mais vezes”. Nota máxima para a performance vocal de Pedro Code que nesta canção, simplesmente brilha.
“Pitchblack” canção com mais electrónica e letras onde sobressai a linha “outside myself can i be real” – com um arranjo complexo e intricado… De seguida mergulho em “The Days”, canção leve e planante tipicamente melancólica na estética dark wave, com um baixo galopante a la Simon Gallup, dos The Cure, boas e fantásticas pistas para o território planante e também dançante a que a faixa nos remete. “Higher Than The Soul”, sobressai pela conjugação do ritmo e das teclas e guitarras em leve crescendo novamente com um baixo aqui dramático, quanto às letras seria apropriado aqui referir que a temática parece ser a que a própria banda esclarece no Bandcamp a propósito deste trabalho, a aceitação do nosso verdadeiro significado, um espelho da projecção da alma para a mente, coisas profundas debaixo de um dia de sol, sirvo-me de outro café e mergulho, outra escolha curiosa de palavras quando devia estar na praia mas estou imerso no universo de sombras que se revelam na luz neste novo trabalho deste colectivo, que na faixa seis convidou Diego Merletto dos The Frozen Autumn para vocalizar este “Awake & Asleep”, não a minha faixa favorita a esta altura pois já estava imerso na voz ambiental de Pedro Code juntamente com a restante instrumentação, efeito das cinco faixas anteriores, mas um momento interessante, divergente, mas interessante. “Shivers” retorna a esse ambiente familiar, com melancolia redobrada, Enquanto “Ouroboros” é um interessante dueto de Pedro Code com Kadri Sammel dos Bedless Bones, projecto que desconheço, a cantora tem um timbre muito agradável e melodioso na entrega e a canção evolui agradavelmente com os teclados a levá-la à sua conclusão.
Confesso que por esta altura estou a ficar levemente deprimido no bom sentido. Este não é um disco fácil de ouvir e não é para qualquer alma, arrisco a dizer que é até este momento o disco mais bem conseguido dos IAMTHESHADOW. Tem um peso e uma atmosfera penetrantes, gosto muito do apontamento minimal de guitarra de Pedro Code em “Grace”, canção intensa e densa, novamente o baixo marcado de Herr G, aqui a transportar as melodias e harmonias, era uma das possíveis escolhas do próximo single na minha humilde opinião. “Rise” com Yvete Winkler dos Vaselyne, aqui a tomar as lead vocals com a voz do mestre de cerimónias mais ao fundo é mais um momento bonito deste disco, assim como “To Last” melancólico, triste e introspectivo que nos leva perto da sua conclusão. “Undress”, todavia, é mais upbeat embora… fez-me lembrar a ambiência das canções do Disintegration dos The Cure, em particular o ambiente de canções clássicas como por exemplo, “Prayers for The Rains”, muito bem – bem feito e com coração. Resumi tudo nesta última frase que não foi, na prática, a última deste texto. Em resumo: vão, vão lá comprar este bonito disco!
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