Pela altura em que digito estes caracteres, é Sábado. Manhã de Sábado a iniciar a audição de Re… dos Mind Reset, são seis canções de um segundo disco deste projecto onde pontuam elementos de várias bandas dos anos 90 (Seres, Duplex Longa, e etc.) – os anos 90, precisamente, ou a altura de viragem na produção musical com o advento do grunge, o canto do “cisne” da MTV, o terrível Napster e a internet – as novas tecnologias digitais… – Enfim, nada que me interesse recordar agora, no entanto e… ou mas surpreendentemente este disco leva-me mais, digo já, para uma portugalidade dos anos 80, e deve ter sido por isso que mo enviaram. Sou uma criança dos 80’s e os mais velhos na época ouviam na altura Diva, ouviam os Joy Division e os Sétima Legião e eu tive de abandonar os discos da Samanta Fox, aprender a assoar o nariz e começar a ouvir alguma música com mais conteúdo.
Naturalmente que ía gostar do disco após o curto “Ansia do Nada”, deixo-me levar pelo estranhamente retro “Canto das Silhuetas”, canção que parece logo ter sido composta noutra altura e parece ser verdade pois é apresentada como uma versão da banda Seres, da qual já aqui referi e onde pontuam elementos dos Mind Reset, é uma bonita canção e é assim um fado tango, como me apetece descrever, a voz de José Henriques a entoar letras como: “Os lírios morreram e eu não te amei, ai esta luzes que cobrem o teu corpo de rosas sujas de sangue, e não me faças morrer por ti nesta cama branca…”.
Enfim, há mais sentimento nesta faixa somente do que em dezenas de discos da nova geração “botox” de fadistas consagrados que por aí andam e fico simplesmente pasmado a tentar entender: porque é que agora que se comemora o centenário de Amália Rodrigues, porque é que nunca mais se tentou encontrar algo que não seja o fado “pastilha elástica” descartável ou a mediocridade pop de tanto disco que realmente não oiço verdadeiramente e quando canções como esta que têm sentimento e são bem interpretadas e arranjadas com bons intérpretes – realmente, tocam as pessoas. Onde estão os caça talentos das editoras por estas “alturas”? Possivelmente ainda a “engordar” à conta dos royalties da Amália que continuaram a sustentar alguns cargos muitos anos depois da sua morte. Com efeito, e de volta ao momento presente, este é um bonito tema: não é o pastiche do costume. Tem sabor antigo mas é bom, tem modernidade também no arranjo embora seja simples, bonito e previsível, é o quanto baste.
“Menino do Bairro Negro” versão da canção de Zeca Afonso, deixa-me um pouco indiferente, não é a minha praia mas tem um bonito arranjo de cordas e o baixo de Carlos Paes a marcar o ritmo com o cajon de Pedro Lourenço. Rapidamente passo para a faixa seguinte “Mel e Fel”, que apreciei bem mais, a voz a levar o ouvinte por paisagens desoladas ou cheias de cor com apontamentos de guitarra minimais de Frederico Pais com o violino de Mario Resende, no final à procura de mais intimidade com o ouvinte, uma excelente sinergia com a banda em estúdio num maravilhoso ponto de equilíbrio. Cinco estrelas esta canção.
“Água Água Água”, é um tema também bonito, bem arranjado. Ouve-se como se ouve este disco lá ao fundo com os seus ambientes e ruídos da natureza samplados a fazerem companhia numa tarde de Verão sem grandes sobressaltos assim como a faixa “Alentejo” que termina a audição é para ser consumido com o estado de espírito apropriado. O rock não cabe aqui, este é realmente um disco de ambientes, um disco de old wave com uma portugalidade que nunca nos abandona, olho para ele como um objecto de colecção que desde o artwork singular, um quadro de José Augusto criado ao ouvir o disco demonstra muito cuidado na sua concepção final.
Re… ideal para melómanos e apreciadores de sonoridades fora da caixa, e para todos os que queiram ouvir algo diferente. Recomendado
ANTI-DEMOS-CRACIA está a fazer a distribuição do álbum “Re…” dos Mind Reset:
Álbum no Bandamp: https://anti-demos-cracia.bandcamp.com/album/re
Este segundo álbum conta com os seguintes músicos:
JH Almeida- voz, samples, produção de som
Frederico Pais- guitarra eléctrica
Carlos Paes – Baixo, produção gráfica e audio-visual
Pedro Lourenço – Bateria, Cajon
Paulo DeMendonça- Teclas, técnico de som ao vivo
Fernando Oliveira – percussões diversas, didgeridoo
Marta Lourenço – violeta
Mário Resende – violino