Crónicas Opinião

Sabotage Rock Club, O abrigo do rock’n’roll

“Ooh, a storm is threatening
My very life today
If I don’t get some shelter
Ooh yeah, I’m gonna fade away”
 

Agosto, 20, 2020. Deveria estar em Coura mas não estou. Poderia estar a fazer mil coisas mas uma guerra invisível está a devastar a humanidade.
Agosto, 20. 2020. Dia que amanheceu em tons de cinza e se apagou do mesmo modo. Com a neblina e uma humidade pegajosa. Aquela que acompanhou o olhar.
Agosto, 20, 2020. Dia em que fui ao meu local de trabalho e no regresso, como fazia antes de estar em teletrabalho, passei por aquele sítio onde constituí família.
Agosto, 20, 2020. Dia em que vi o Sabotage a ser destruído por dentro por pessoas desconhecidas.
Agosto, 20, 2020. Dia em que o meu coração se despedaçou, deixando bocadinhos dele perdidos entre o pó de uma empreitada que constrói um futuro negro. 

A história que vos vou contar é romântica e até pode nem ter interesse para vocês! Descreve um amor que foi crescendo à base do rock’n’roll e de um apego gigante àquilo a que chamo alimento da alma. Daí veio aquela família que não é de sangue, mas sim de alma, garra e coração e que vê, agora, o seu lar destruído sem qualquer alicerce ou base estável onde se agarrar.

© Luis Sousa – The Telescopes (2014)

Algures em 2014 conheci o Sabotage. Fui ver a banda de um amigo meu e só voltei a entrar naquela cave magnética em 2015 já com frequência e regularidade. Foi lá que conheci a pessoa que me guiou até ao Música em DX, que me está a dar voz à dor neste momento. Através do Música em DX, o Sabotage começou a ser poiso quase semanal e constante tanto em soundchecks como em concertos e entrevistas, sendo a nossa presença tão frequente que foi criada a parceria Sabotage – Música em DX. Foi lá que, em 2017, concretizei mais um sonho e entrei directamente para a família. Normalmente é isso que acontece na música, vamos atrás de sonhos! Foi lá que, em 2018,  o Música em DX celebrou a única festa de aniversário até à data, e que festa!

© Luis Sousa – 4º Aniversário Música em DX (2018)

Foi no Sabotage que aconteceram muitas coisas e todas elas me fizeram crescer enquanto pessoa, enquanto amante de música e enquanto profissional. 

O rock’n’roll é aquela força da natureza que nunca vai desaparecer. Que une, destrói, mata, rejuvenesce, liberta e dá, de uma forma completamente inexplicável, uma corrente energética que cria explosões mentais e corporais de forma tão intensa que se torna um vício. Durante anos a fio salas se tornaram míticas por ter esta corrente de energia que tanto é invisível como quase palpável e, em Lisboa, depois do Rock Rendez Vous e do Johnny Guitar, veio o Sabotage, que deu um salto no desconhecido numa era que começava a ser de tecnologia e da aparência com uma mala de viagem cheia de certezas de que o sonho guia e o rock’n’roll dá força. 

© Luis Sousa – Mão Morta (2016)

A descoberta de todo um mundo novo fez-se e o amor ao rock’n’roll ia crescendo à medida que me ia desgastando o corpo. As histórias, estórias, amizades, ligações, energias, zangas, ralhetes, foram aumentando o tamanho deste coração e deixando a cada dia uma marca mais profunda. Desengane-se quem acha que esta vida é um mar de rosas! Desengane-se quem chega a um sítio e vê uma banda a tocar pensado ser tudo tão fácil. Não é! Nem para as bandas, nem para a produção. Mas é esta luta constante de ambas as partes que vai fortalecendo as certezas de que estamos no caminho certo. O amor consegue dar força para ultrapassar o que vem, tal como os alicerces da casa onde habita a família. Foi assim que o Sabotage nasceu, cresceu, amadureceu e se enraizou numa cultura alternativa nesta capital que apodrece de dia para dia. Por motivos que ultrapassam a força, o Sabotage não chegou a completar 7 anos de portas abertas e não pôde fazer uma festa de despedida. Consome-me uma dualidade de sentimentos em relação a isto que passa pela falta de encerramento de capítulo cruzando a ansiedade do momento da despedida. No limite, tento e quero acreditar que esta forma abrupta de ruptura foi a melhor para os diversos mundos.
Resta dizer que foram 5 anos (falando por mim) que pareceram mil e que a saudade vai amadurecer e crescer na mesma melancolia
tuga que tão bem a usa. 

© Luis Sousa – The Cavemen (2018)

Carlos, Ana Paula, Zé Maria, Rabino, Carolina, Edu, Tiago, Vanda, Vítor, Beatriz, Natacha, Valu, Chaby, Ruca, Joana, Silvana (as 2), Elisete, Zé, Iuri, Cid, Paulinho, Valverde, Manel, Leo, clientes, bandas, DJ’s e amigos (os que lá encontrei, os que lá fiz e os que lá deixei de ter) obrigada por este caminho que fizemos juntos. Que nunca deixemos de acreditar e lutar pelos nossos sonhos e, se um deles for o rock’n’roll, voltaremos a estar todos juntos!
Acima de tudo, que nunca nos falte a música. 

Agosto, 26, 2020. Há merdas difíceis de escrever. 

“Well the music is your special friend
Dance on fire as it intends
Music is your only friend
Until the end
Until the end!”