A dicotomia entre a luz e o breu consegue criar uma passagem entre eles que ganha forma de acordo com o nosso sentir e imaginação. Essa passagem, por ter uma energia neutra, faz com que a pureza do sentimento vá aumentando e toda a sensibilidade fica mais forte.
Já vos falei de Jodorosky na mão do alter-ego de Tiago Castro, Acid Acid. De casa para uma sala, a viagem fica ligeiramente diferente.
À meia luz, com o sol a seu lado foi às 20h que, na Associação Movimento Presente, Acid Acid mostrou o seu mais recente disco no passado dia 8 de Outubro. A magia dos concertos ao vivo é que se sente uma vibração que o disco não consegue dar e há uma partilha de almas onde o magnetismo musical se vai apoderando de todos fazendo com que haja apenas um só naquele local.
A introdução começa em crescendo passando pelo toque da guitarra com o arco de violino que faz com que sintamos o vento a vir na nossa direcção. Vozes com algum tormento ecoam ao nosso redor numa espécie de leitura de feitiço e antecedem os tambores esperançosos. Um arrepio profundo enche-nos o corpo e, lentamente, sentimos que que deixamos de ser donos dele. A guitarra é aguda e circula-nos fazendo espalhar a carga energética em forma de ondas com as quais nos deixamos ir. De repente, transe profundo e os arrepios regressam em força. A matéria que habitamos enche-se de algo muito forte que nos inunda o corpo, a alma, a mente e o coração.
Sensualmente e sem pausas transitamos para a segunda parte da viagem com uns acordes de guitarra a cheirar ao de leve a The Dark Side Of The Moon. Ao nosso redor e a tocar-nos suavemente chegam ondas distorcidas e psicadélicas dotadas de um magnetismo tão forte e brilhante qual ondas que descem das naves de ET’s nos filmes. A intensidade aumenta minuto a minuto e a guitarra fica áspera, rompendo uma melodia quase angelical. Descemos à terra lentamente com a calmaria das teclas e levamos um abanão antes de regressarmos totalmente ao corpo.
Houve menos paisagens que em casa, mas houve momentos enérgicos que fizeram de nós marionetas e nos mantiveram a pairar com calafrios, suspiros e arrepios. Enquanto estávamos no ar, a sensação de libertação não podia ser mais genuína e pura.
A viagem foi mais forte e intensa mas senti falta da beleza envolvente da flauta ficando a ânsia de a sentir de uma próxima vez.