O dia acordou com mais luz do que o anterior e o sol prometia começar a aquecer a vila de Paredes de Coura.
Esperava-nos um dos dias esgotados e mais fortes do festival. Um dia que ia ficar marcado por alguns dos concertos mais fortes do festival e não falo de Idles!
A maratona começava no palco secundário com os electrizantes Gator, The Alligator. Todos a condizer e em harmonia passaram pelo seu disco mais recente Mythical Super Bubble não deixando para trás êxitos do primeiro disco, já conhecidos e acompanhados pelo público. O fuzz brinca connosco em modo flippers, a energia do garage extasia-nos e o psicadelismo faz-nos viajar para longe. Termina em modo loucura com dois companheiros de estrada a tomar conta da guitarra e baixo, para os seus donos virem fazer crowdsurfing na multidão.
O concerto seguinte seria, talvez, aquele que mais desilusão trazia neste dia. Porridge Radio era uma banda que ansiava ver e, por momentos, senti a força de algumas músicas dissipar-se em cima do palco. A voz de Dana é extremamente forte e bela, podendo ser usada de um modo mais poderoso e não tão enfadonho como se tornou este indie rock igual a tudo.
Alex G, no palco principal acompanhou a suavidade do indie rock, perfeito para aquele relaxamento de fim de tarde sentados na relva. Apesar de se manter num registo ténue por um longo período de tempo, conseguiu surpreender com uma explosão sonora e agressividade vocal já perto do fim do concerto, provando uma versatilidade que agrada.
De regresso ao palco secundário, com um furacão chamado Indigo de Souza, sentimos um regresso aos anos 90 com uma possível Alanis Morrisette do séc XXI. O poder que a cantautora transmite na postura, voz e composições é contagiante prendeu-nos de imediato. A voz polivalente de que é dona é algo capaz de estremecer a terra e a nós também! Foi um concerto carregado de boa energia, talento e boa disposição que devia ter perdurado no tempo ou então ter sido trocado com o que viria a seguir.
Badbadnotgood, na sua essência de jazz e meramente instrumental, perde-se num palco tão grande como o principal e acaba por se tornar num momento de banda sonora meramente relaxante e não num concerto a que se queira assistir naquele anfiteatro. Não retiro qualquer qualidade à banda, apenas o sentido de local e hora errados como já anteriormente tinha sentido na sua estreia no festival.
Para levantar o astral e dar um boost de satisfação e entusiasmo vinha um dos concertos que está no top 5 desta edição. The Murder Capital foram uma excelente surpresa e poção de magia que sentimos até aos ossos. O post punk que estes irlandeses tocam transpira sensualidade e intensidade de tal maneira que deixa uma espécie de desconforto em modo de formigueiro no limbo que existe entre os nossos corpos e a alma que neles habita. Com um baixo exageradamente bom tal Joy Division e um frontman que não precisa de muito para ter o público a seus pés, passaram pelo seu disco de lançamento e deixaram-nos com taquicardia e algum desnorte.
De seguida, aquele que muitos ansiavam. Confesso que nunca senti especial nervosismo por Idles mas fui de mente e coração abertos deixando-os à deriva desta banda que tanto tem dado que falar. Na verdade, ter visto o concerto de costas teria sido a melhor opção! Não desfazendo das qualidades musicais e de composição destes cinco rapazes, o cheiro a produto, a máquina e a falso conseguiu falar mais alto. Desde a falta de relação ou comunicação entre a banda, ao pseudo Kurt Cobain o que se passou em cima daquele palco foi um cocktail de hits musicais e vocais que ficou moda em certo momento deste tempo (e bem! o rock precisa de ser notado com mais força!). O que me mostraram nesta noite foi apenas um produto pré concebido para aproveitar um movimento que ganhou voz, sem qualquer alma ou sentido. Claro que esta que vos escreve é um mero grão no meio de milhares de almas que se entregaram a eles, saltaram, vibraram e cantaram com eles com direito a um circle pit gigante e estrondoso.
Numa espécie de tentativa de acalmar os ânimos, os americanos Beach House que se apresentaram em trio, apareceram por entre o negrume habitual e no seu registo habitual. Ténue, sonhador e sempre igual desde o dia em que se formaram. Aliás, os Beach House, podiam ter só lançado uma música na sua carreira, pois cada concerto que vejo deles traz consigo a sensação de que tocam a mesma canção em modo contínuo e prolongado no tempo, não tentando sequer inovar ao longo dos anos.
Agradeço, no entanto, ter existido Beach House antes do verdadeiro estrondo, pois a intensidade veio de rojo, sem pedir licença e a dar tudo o que havia para dar!
Falo, claro esta, do segundo melhor concerto deste festival e do melhor concerto do dia! Os Viagra Boys assumem as suas posições e ao primeiro acorde, houve um mosh colectivo onde uma onda de loucura e satisfação se apoderou de todos até ao final do concerto. Todos perderam as suas posições e os seus amigos e pouco importava! Naquele histórico momento, éramos todos Viagra Boys e todos tiraram os pés do chão.
A postura irónica, despida, despreocupada, embriagada de Sebastian é o toque rebelde que ajuda a caracterizar a banda. Houve uma explosão sensorial onde cada instrumento nos tocou e abanou deixando-nos numa espécie de hipnose que, talvez, o saxofone comandava. Sem tempo a perder, mas com tempo para piadas e idas ao WC e outras tantas coisas a que assistimos, o concerto fez-se em modo feroz e sem merdas. Foi o primeiro concerto da tour de apresentação do novo disco e, na verdade, não precisam de muito para dar tudo! Creio que vivem o dia a dia como se o amanhã não chegasse e isso não se dissipa do que são em palco.
De ressalvar o/a fã que, na música “Sports” atirou uma meia dúzia de bolas de ténis para o palco, contribuindo para o embelezamento do momento.
O que sentiu neste fim de noite foi a comunhão de almas inquietas que se revelam com a música. A alma que faltou no concerto anterior do quinteto irlandês.
Podiam vir 10 bandas Idles que, todas juntas, não chegavam aos pés destes senhores!
Depois disto, podíamos ir para a cama de barriga, alma e coração cheios, deixando que o ritmo acompanhasse o sorriso que levávamos rasgado no rosto.