Saor foi muito bom, Mão Morta foi superior e Epica foi excelente, mas os Samael, com aquela energia em palco e a meterem a carne toda de uma vez no grelhador, foram os reis do segundo dia.
INJECTOR
Os “nuestros hermanos” Injector foram uma das bandas que firmaram a colaboração do Vagos Metal Fest com o Rock Imperium Festival, que decorre anualmente em Espanha. Ainda que seja uma iniciativa digna de louvor, os Injector implodiram o seu thrash metal com um volume sonoro absurdo e até doloroso nos ouvidos. Com os tampões auriculares da praxe sofremos a tirar fotografias; sem eles, não queremos imaginar. Olhámos para o palco e vimos o guitarrista Danny B a pedir vigorosamente para que lhe subissem o som da guitarra e foi nessa altura que fugimos.
MORPHIUM
Os catalães Morphium rapidamente mudaram o tom amador da banda anterior e foram uma agradável surpresa em cerca de 50 minutos. Praticantes de uma mescla de Metalcore com nu-metal e ares de metal industrial entrelaçado com gótico, conseguiram cativar as atenções quando ainda era tão cedo, algo que por si só é digno de nota. Excelente presença em palco, muito carisma e claro gosto pelo que fazem, poderiam ter tocado mais 30 minutos e ninguém se teria aborrecido. Ainda que muito influenciados por Korn, têm um som próprio muito interessante que já deveria ter dado frutos mais gordos.
SAOR
E se é verdade que o nome na boca de todos os festivaleiros no segundo dia do Vagos Metal Fest era “Epica”, o único em que a Música em DX conseguia pensar era “Saor” (lê-se “seur”). Os escoceses são um caso raro: praticam black metal atmosférico com severas influências musicais gaélicas e uma noção de composição e melodia superior. Em menos de 10 anos, os caledonianos ascenderam à velocidade da luz ao Olimpo da música pesada, algo a que a Season of Mist prestou a maior atenção assegurando a contratação do colectivo de um – ao fim e ao cabo, Saor é Andy Marshall e Andy Marshall é Saor. “Guardians” de 2016, continua a ser uma dos discos mais repetidamente tocados na nossa redacção e o porquê é mais do que claro. Prestação de sonho.
MÃO MORTA
Comparamos os Mão Morta aos Motörhead com facilidade por um motivo simples: conseguem juntar no mesmo público rockers, metaleiros, punks, góticos e qualquer outro estilo alternativo naturalmente, sem dificuldade. Liderados pelo fruto do casamento improvável entre Dionísio e Aglaia, ou Adolfo para os amigos, o colectivo bracarense nunca mais deixou de mandar biqueiradas certeiras no inconsciente colectivo nacional, experiência após experiência, como uma passagem de “Le Misanthrope” e da natureza inflexível associada à obra. “É Um Jogo”, “E Se Depois”, “Cão Da Morte”, “Novelos Da Paixão”, “Lisboa”, “Budapeste”… foi apenas um punhado de temas que nos fez apreciar a banda, dançar, repetir refrães, enfim… ficamos sempre com a impressão de que um concerto de Mão Morta é um eufemismo para “best of”. Ainda que algo inertes devido a uma aparente lesão de Adolfo Luxúria Canibal, um concerto de Mão Morta é sempre sinónimo de maiusculização em qualquer certame musical.
SAMAEL
A relação de amor entre os Samael e Portugal é de longa data: das histórias de jantares em Coimbra cozinhados pela (e em casa da) mãe do organizador que os trouxe à cidade dos estudantes e passando pelas visitas de Michel “Vorph” Locher aos seus amigos nacionais, proprietários de vinhas enquanto produtor do néctar dos deuses, já pouco nos conseguiria impressionar. A não ser, claro, uma setlist orientada para os momentos iniciais do grupo e com foco em “Passage” e “Ceremony Of Opposites”, os dois trabalhos-mestres da banda suíça. O início do concerto, composto por “Rain”, “Shining Kingdom” e “Angel’s Decay”, e mais tarde concluído por “Jupiterian Vibe”, anunciou as intenções mais progressivas dos Samael. Invariavelmente, agradaram aos fãs mais antigos e aos mais recentes com a passagem em revista por discos mais tardios como “Hegemony”. Sonhamos com o dia em que os veremos como cabeças de cartaz.
EPICA
Os cabeça de cartaz do segundo dia do Vagos Metal Fest foram os arrastadores de multidões Epica. Esta redacção viu-os há dois anos no Estádio Nacional na ronda de promoção de “Omega” e a ideia inicial mantém-se: quer agradem, quer não, os holandeses Epica são mestres na arte de fazer metal progressivo e sinfónico de primeiro escalão. Claro que a presença e a voz de Simone Simons ajudam a explicar o sucesso ímpar que o sexteto das terras baixas grangeia junto dos seus fãs em todo o globo. A inicial “Abyss of Time” foi o pontapé de saída para cerca de 90 minutos de puro profissionalismo e que prometeram colocar o Vagos Metal Fest uns degraus acima do patamar em que se encontra. Claramente esperados por uma multidão considerável, os Epica não variaram em quase nada a sua setlist de outros palcos onde tocaram anteriormente ou onde tocariam posteriormente, mas a sensação de dever cumprido via-se na cara de cada festivaleiro no fim do concerto.
GOD DETHRONED
A “casadela” não poderia ser mais óbvia ou afortunada – depois do metal progressivo e sinfónico dos holandeses Epica, assinados pela Atomic Fire Records, eis que chegaram os também holandeses e também assinados pela Atomic Fire Records God Dethroned. Só mudou o tom da dança, com estes últimos a desempenharem uma fórmula mais do que estabelecida de blackened death metal, por vezes épico, por vezes melódico, mas sempre de elevadíssima qualidade. Com o o novo trabalho “The Judas Paradox” à porta e com data de lançamento marcada para o mês de Setembro, os God Dethroned tiveram a oportunidade de se fazerem lembrar junto da comunidade nacional e foram o antídoto certo para o público mais orientado para o som extremo depois dos Epica. De ressalvar a qualidade e limpidez sonora geral ao longo da actuação, que foi mais uma das valências da organização do Vagos Metal Fest 2024.
© Sónia Ferreira / World Of Metal