Em quase tudo o que vou escrevendo, começo pela descrição das noites. Ou mais raro, dos dias. A temperatura sobretudo, porque apesar de ser fácil o acesso às datas da maioria das coisas que vamos assistindo, a temperatura exterior a uma sala de concertos ainda molda de alguma forma o que lá dentro se vai passando, a disposição da plateia e o desencadear de todo o ritual que é um concerto.
O frio demorou este ano, foram poucas as vezes que me lembro de começar dezembro sem ter frio. Apesar de saber que isso não é nada bom sinal, que é sintomático de tudo o que de errado se passa neste pequeno ponto do espaço sideral, não posso negar que o aproveitei bem, mas esperar que a 12 isso ainda se mantivesse talvez fosse já demais por isso muni-me do meu melhor casaco sabendo que mal entrasse no Music Box teria de me livrar rapidamente dele.
Cais do Sodré, quinta feira e já se respira fim de semana. Em dezembro um pouco mais e nesta quinta feira, à hora marcada, a sala emanava uma energia de noite de verão e não de noite bem gelada. O duo belga Hun Hun, no seu tom morno e ambiental ajudou a começar a noite no crescendo pretendido mantendo sempre uma plateia estável mas que no final já se mostrava inquieta, ou impaciente por mais que ambientes mornos.
Hun Hun
Os Errorr entraram em palco com o Music Box já completamente repleto e bastante expectante. A pausa entre concertos moldou a sala para este momento e a banda nascida da ideia e execução de Leonard Kaage soube fazer a entrada deixando a plateia como que meio suspensa para rodarem rapidamente Heroine e Not Even Bored do primeiro disco Self Destruct (2023, Anomic Records), e aproveitando para mostrar já no alinhamento músicas que não aparecem no álbum Self Destruct nem no EP de 2021, Servant.
À terceira música já tem pelo metade da sala completamente por conta deles. E acredito que o resto também.
Agarraram sempre melhor o público nos momentos mais duros e densos, a mais densa batida e a mais dura distorção bem combinadas. Outros momentos com um certo travo a melancolia não alcançaram talvez o impacto desejado. Parecem muito mais seguros e dentro daquilo que mostram em músicas como Paranoia do que em With Love From the Grave, se bem que na realidade, o que mais impacta nos Errorr é mesmo a qualidade em palco. Em disco, dá para perceber ao que veem mas isto funciona mesmo bem é em palco. Ou seja, o disco não lhes faz justiça.
Errorr
Para os Máquina este será o último de uma série de concertos na residência que mantiveram no Music Box durante este ano e que trouxeram inclusive as colaborações em palco de Surma e Tó Trips a interpretarem respectivamente Prata (2024, Fuzz Club) e Dirty Tracks For Clubing (2023, Saliva DIva).
55 minutos de concerto que agarraram toda a plateia desde o primeiro minuto, sem respirar uma vez mais. Os Máquina continuam a expandir o seu frenesim dançável, numa relação cada vez mais simbiótica com o seu público.
Com mais algumas datas no horizonte, a preencher a semana seguinte, os Máquina estão de facto num pico de forma invejável por todas as razões e mais algumas. A energia que emanam e atraem em seu torno, parece prestes a explodir, mas ao mesmo tempo parece já ter explodido e que tudo o resto a que assistimos agora é apenas uma gigante onda de choque dançável e libertadora que desejamos que não acabe nunca.
Máquina
Hun Hun – https://hunhun.bandcamp.com/
Máquina – Música | MAQUINA.
Errorr – Música | ERЯORR